OBSERVARE
Universidade Autónoma de Lisboa
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024)
415
RECENSÃO CRÍTICA
Aguirre, Mariano (2023). Guerra Fria 2.0. Barcelona: Icaría. ISBN
978-84-19200-76-1
PAULA ALFAIATE DA LUZ
paula.alfaiate@funiber.org
Mestranda em Relações Internacionais, na Universidade Autónoma de Lisboa (Portugal).
Licenciada em Relações Internacionais, na referida Universidade. Traduziu o livro Guerra Fria 2.0,
de Mariano Aguirre. Assessora de Admissões na Fundação Universitária Ibero Americana e
Universidad Europea del Atlántico, em Lisboa.
No seu livro Guerra Fria 2.0, Mariano Aguirre, analisa os acontecimentos mais relevantes
dos dias de hoje e até que ponto estes são ou não comparáveis aos tempos da Guerra
Fria, dominados pelo confronto capitalismo vs comunismo. Além de destacar os principais
atores no sistema internacional, as diferenças substanciais no alinhamento destes e o
que representam atualmente estes poderes num mundo multipolar, marcado pela crise
da democracia, a ascensão de movimentos extremistas, o impacto das alterações
climáticas, o uso das novas tecnologias e a inteligência artificial, onde os interesses de
cada um suplantam o bem estar de todos.
Este será o mote para a análise do autor, recorrendo a diferentes e credíveis fontes
bibliográficas, o que nos leva a questionar o que nos espera o futuro, evidenciado um
presente pródigo em acontecimentos reveladores de um mundo em ebulição.
A nível estrutural, o livro está dividido em catorze partes, os agradecimentos, a
introdução, dez capítulos, um índice onomástico e um último capítulo sobre o Autor. O
prefácio é do Dr. Luís Tomé, Diretor do Departamento de Relações Internacionais e do
OBSERVARE, da Universidade Autónoma de Lisboa.
Na Introdução, Aguirre defende o porqdo título deste livro, Guerra Fria 2.0, e o que
os debates em Espanha e na América Latina suscitaram, na possibilidade de este ter ou
não um ponto de interrogação. Contudo, o objetivo, segundo o autor, não é debater se
existe uma nova Guerra Fria, mas sim destacar que alguns dos aspetos mais importantes
dos anos 1947 48 até 1989 1991 podem repetir se, como a corrida aos armamentos,
a incerteza quanto a acontecimentos políticos, económicos e sociais e o adjetivo “fria”
“entre uma realidade de tensões em múltiplos domínios, incluindo o da segurança militar,
mas em que se mantém um equilíbrio delicado”. E como exemplos atuais, o conflito na
Ucrânia e a disputa da soberania pela Ilha de Taiwan, assim como os EUA, a China e a
Rússia podem atuar no chamado Sul Global.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 12, Nº. 1 (Maio-Outubro 2021), pp. 415-422
Recensão Crítica de Aguirre, Mariano (2023). Guerra Fria 2.0. Barcelona: Icaría.
ISBN 978-84-19200-76-1.
Paula Alfaiate da Luz
416
No primeiro capítulo, Da Guerra Fria à Globalização, o autor analisa o período bipolar da
Guerra Fria, entre os EUA e a URSS, sendo que de acordo com Odd Arne Westad, o
confronto entre o capitalismo e o comunismo teve o seu início no final do séc. XIX, e para
Jürgen Ostherhammel, nesta fase estivemos perante grandes transformações nos mais
variados âmbitos (científico, tecnológico, político e bélico). E tudo isto determinou o que
é hoje o mundo atual.
Existindo um reforço da capacidade nuclear não por parte dos EUA e da URSS, mas
também da França, da China e da Grã Bretanha, com acordos que se formaram nesta
fase e que no presente além de terem sido abandonados, a letalidade e a sofisticação
das armas nucleares são substancialmente superiores e que o perigo da sua utilização é
mais visível.
Apesar dos dois modelos económicos referidos acima e que dominaram o período da
Guerra Fria, neste contexto de globalização estamos perante uma dependência e
competição mais evidente entre as potências atuais, ao nível económico, comercial e
tecnológico, como é o caso da deslocalização das fábricas europeias para Pequim.
Além disso, novas formas de propaganda através das redes sociais, a proliferação de
fake news ou mesmo métodos sofisticados, com a utilização de algoritmos, o que lhes
permite alterar resultados eleitorais, como sucedeu com as eleições nos EUA. A tais
fenómenos Aguirre denomina como a opacidade das novas tecnologias.
O segundo capítulo, Um Só Sistema Mundial, está centrado nos desafios que o confronto
entre os EUA e a República Popular da China enfrentam atualmente, distinto do período
da Guerra Fria entre os EUA e a URSS.
Sendo que a ideologia deu lugar a um sistema económico neoliberal, onde todos os
Estados se inserem, o que impactou os sistemas democráticos, provocando uma maior
desigualdade, segundo Organizações Internacionais, como as Nões Unidas.
O comunismo embora não seja uma ideologia dominante no espectro político, a
ascensão da extrema direita veio colocar à tona algo do passado, como o intensificar
do terrorismo, a criminalidade organizada, existindo um bode expiatório nos migrantes,
muçulmanos, asiáticos, latinos, como se quisessem tomar o lugar da “população branca”.
O confronto bipolar da Guerra Fria, transformou se num confronto entre várias
potências: os EUA, a China, a URSS e a Índia e potências regionais, como a Turquia e os
denominados países do sul que pretendem ter um papel importante no panorama
internacional, alterando a ordem multilateral vigente. O autor acrescenta a relevância do
diálogo entre as partes para diminuir tensões, assim como responder a novos desafios,
por exemplo, a ascensão da Inteligência Artificial.
No terceiro capítulo, Multipolaridade e Poderes Emergentes, o autor distingue a ordem
mundial que nos regia durante a Guerra Fria (bipolaridade) e a que se reflete nos dias
de hoje (multipolaridade), onde diversos atores exercem a sua influência e nem sempre
conseguem superar a capacidade dos demais. Os países chamados de emergentes, o
grupo dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), abrange 46% da população
do planeta, o que corresponde a 24% do produto interno bruto (PIB). Tal como o seu
poder no mundo é cada vez mais evidente, apresentando se como a “voz do mundo
emergente e em desenvolvimento”, apesar de ainda manter uma posição inferior ao G7,
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 12, Nº. 1 (Maio-Outubro 2021), pp. 415-422
Recensão Crítica de Aguirre, Mariano (2023). Guerra Fria 2.0. Barcelona: Icaría.
ISBN 978-84-19200-76-1.
Paula Alfaiate da Luz
417
devido à paridade das moedas transacionadas. (O’Neill, 2023). Amitaya Acharya
menciona que a inexistência de uma potência dominante associa-se a uma crescente
interdependência.
Esta questão dos países emergentes, como refere Aguirre, pode levar nos a erros
conceptuais no que aos “países do sul” diz respeito, visto que falamos da China e da
Rússia, que aproveitam a sua posição geográfica, mas são potências em ascensão, com
níveis distintos de desenvolvimento face à Índia, Brasil e Turquia. E outras potências com
influência regional, como é o caso de Israel, que segundo os ditames oficiais, a criação
do seu Estado é o resultado do interesse britânico em que estes tivessem o seu próprio
território, da história do sionismo e do Holocausto. Estes países não apresentam uma
alteração na ordem económica e liberal face à existente, apenas pretendem que a sua
voz seja mais ativa nas tomadas de decisão, nos mais variados âmbitos.
A Índia, considerada a maior democracia do mundo, bastante desenvolvida a nível
tecnológico, com tremendas debilidades nos campos social e económico, possui armas
nucleares e oscila o seu apoio de acordo com os seus interesses (na redistribuição de
poder, apoia Moscovo e Pequim e na sua política externa de não alinhamento, está
próxima da Rússia e dos Estados Unidos) e faz parte do Quadrilateral Security Dialogue,
com os EUA, o Japão e a Austrália, com o objetivo de controlar a influência da RPC na
Ásia Pacífico.
O autor no quarto capítulo, As Grandes Potências e o Sul Global, debruça se na questão
da Guerra da Ucrânia e o quanto esta veio desviar as atenções de outras regiões não
menos importantes. o quer dizer com isto que a invasão da Rússia na Ucrânia não
tenha criado um forte impacto na Europa e que a mesma não seja legítima. Contudo,
levou a um aumento dos preços e a um desequilíbrio financeiro, com forte impacto nos
países por si afectados, que corresponde a 24% da população mundial, cerca de 60
países, e destes, 73% vivem em pobreza extrema.
No momento actual, falamos de formas distintas de guerra. Durante os anos 1991 2010
existiam menos guerras, mas com a “Primavera Árabe” e o surgimento do Estado
Islâmico, estamos perante um aumento no investimento de orçamentos militares e
atores não estatais, tal como o crime organizado, milícias e grupos de guerrilha.
Tudo isto aliado ao declínio dos Estados Unidos, enquanto grande potência, a ascensão
da China e a própria invasão da Rússia na Ucrânia, assim como o uso das armas nucleares
como um recurso cada vez mais provável, vem demonstrar que os conflitos vieram para
ficar e quiçá mais mortíferos e destrutivos. Nesta linha de pensamento, a fragilidade dos
estados, desde a sua liderança à existência de grupos terroristas, fronteiras cada vez
mais porosas, desde logo mais suscetíveis a que as grandes redes internacionais operem
nos seus países e controlem os sectores económico e financeiro, provocando uma maior
dependência entre os países do sul em relação aos do norte, afetados por níveis distintos
de pobreza, desigualdade, violência, divisões internas e o impacto das alterações
climáticas Segundo o autor, muitos destes problemas são o resultado do passado
colonial, imperial e posteriormente da Guerra Fria e das alianças que se criaram até
então.
O quinto capítulo, Os Estados Unidos, Crise Interna e de Liderança, reforça a percepção
que temos deste país, enquanto potência hegemónica (algo que manteve desde a Guerra
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 12, Nº. 1 (Maio-Outubro 2021), pp. 415-422
Recensão Crítica de Aguirre, Mariano (2023). Guerra Fria 2.0. Barcelona: Icaría.
ISBN 978-84-19200-76-1.
Paula Alfaiate da Luz
418
Fria), e epicentro da ordem liberal internacional do após a II Guerra Mundial. No entanto,
encontra se em declínio por fatores internos
1
, que se repercutem no seu poder no
mundo. Tudo isto aliado ao negócio de armas que assola o país, sendo que a sua
população é de 238 milhões de habitantes e estima se que existam 390 milhões de
armas, que são detonadores para o que alguns analistas consideram razões para uma
possível guerra civil.
A verdade é que o cansaço da sociedade americana pelo fracasso na participação em
guerras duradouras, como é o caso do Iraque e do Afeganistão, e os gastos ecomicos
nas guerras, leva a que os EUA percam algum prestígio ao nível interno e externo.
Aguirre frisa que Joe Biden e o seu secretário de Estado, Antony Blinken, aplicam
uma política pragmática, onde os interesses económicos e políticos a nível interno
suplantam a defesa da democracia e dos direitos humanos no exterior.
Contudo, existem diferenças face à anterior administração no que às OI diz respeito,
Trump retirou os EUA do Acordo de Paris, da OMS, com críticas constantes às Nações
Unidas, enquanto Biden no seu discurso na 77.ª Assembleia Geral das Nações Unidas,
reiterou o apoio a esta Organização Internacional, inclusive, defendeu a reestruturação
do CSNU.
O sexto capítulo, A China, a Caminho da Consolidação de uma Grande Potência, o autor
reforça a relação entre os Estados Unidos e a China e a importância de ambos quererem
evitar uma nova Guerra Fria, após o encontro realizado em setembro de 2022. Foram
discutidos temas sensíveis, como a questão comercial (o facto das cadeias de produção
se deslocarem para a China), os exercícios realizados pela China no Pacífico, entre outros
pontos de igual importância, não colocando de lado a Guerra na Ucrânia e o não uso das
armas nucleares, bem como a sua ameaça, optando por estarem em sintonia em áreas
tão sensíveis como as alterações climáticas, a segurança alimentar e a “estabilidade
económica”.
O seu progresso levará a que, segundo alguns autores, ultrapasse os EUA ao nível
comercial, tendo a indústria no campo de energias solares, dos veículos eléctricos e na
inteligência artificial o seu expoente máximo, como líder em oito empresas de tecnologia,
das vinte que existem no mundo.
Os seus cidadãos, apesar do controlo que existe por parte do regime chinês, preferem
viver num país desenvolvido do ponto de vista económico, que lhes proporcione o acesso
ao consumo, do que viverem na imprevisibilidade. Sendo que se depara com problemas
sociais que poderão ter consequências no futuro, como a baixa natalidade, uma alta taxa
de desemprego na população jovem, graves problemas de seca e de poluição e as
questões de Taiwan e da província de Xinjiang (várias vezes é acusada de reprimir o
povo uigure).
1
Entre outras possíveis razões: Questões relacionadas com a política interna, desencadeando uma grave
crise nos setores democráticos, o que provoca a ascensão dos líderes extremistas, onde grupos organizados
operam e fragilizam a democracia e a sociedade no seu todo, numa óptica anti-estado; a falta de
competitividade na indústria, provocando a deslocação das empresas para outros países, como a RPC; o
aumento da desigualdade e, consequentemente, da violência nas ruas. Além também, do que o autor
designa como “guerras culturais”, estas associadas à migração, ao modo como a lei do aborto é analisada
em cada Estado, o revisionismo histórico da escravatura, entre outras.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 12, Nº. 1 (Maio-Outubro 2021), pp. 415-422
Recensão Crítica de Aguirre, Mariano (2023). Guerra Fria 2.0. Barcelona: Icaría.
ISBN 978-84-19200-76-1.
Paula Alfaiate da Luz
419
No campo do multilateralismo, está cada vez mais presente nas várias organizações
internacionais, na participação em Fóruns e organizações de matriz regional. Tendo como
um dos seus objetivos principais o seu grande projeto Belt and Road Initiative, através
do investimento de infraestruturas, sendo fundamental nas suas exportações e projeção
de poder a nível internacional.
No sétimo capítulo, a Rússia, um Gigante Militar com Debilidades, o autor destaca um
ponto que nos parece fundamental: o porquê da obsessão da Rússia pela sua segurança.
Esta provém do séc. XVI, devido ao seu extenso território sem fronteiras naturais, da
invasão napoleónica no séc. XIX e , posteriormente, as duas invasões por parte da
Alemanha no séc. XX. E por isso, nos dias de hoje, a sua constante preocupação pela
expansão da NATO junto às suas fronteiras.
O final da URSS, considerado por Putin como o grande desastre geopolítico do séc. XX,
aliado ao final de “uma economia centralizada para a privatização e a abertura política”,
liderada por Boris Ieltsin, conduziu o país a níveis de corrupção que se manifestam até
hoje. Através de empresários e políticos que passaram a controlar 25% do PNB da Rússia
e que se transformaram numa elite económica, com investimentos no ocidente nos mais
variados setores.
Com o início da Guerra da Ucrânia, foram impostas sanções à Rússia, sendo estas um
elemento poderoso para controlar o aumento do stock de armas e munições. O que não
retira a Putin considerar o seu país uma grande potência e desafia os Estados Unidos a
assumirem que a ordem liberal está acabada e que assumam um mundo multipolar, tal
como o ocidente admita que perdeu o poder baseado em regras que já não se aplicam
nos dias de hoje.
No oitavo capítulo, um Mundo de Desafios para a UE, o autor destaca os principais
desafios da UE, sendo que estes centram -se não nas dificuldades em introduzirem
uma política externa de segurança e defesa comuns, que veio a intensificar se com o
conflito da Ucrânia e também na asceno de governos autoritários, os movimentos de
extrema direita, no controlo da migração, relegando para a Turquia, Marrocos e a Líbia
o controlo de todo este processo. Além da proximidade de alguns países com a Rússia,
a instabilidade no Médio Oriente que afecta parte do Norte de África e a insegurança
vivida na Europa pela entrada de terroristas pertencentes ao Estado Islâmico,
exacerbaram as dificuldades europeias.
Outro dos obstáculos passa pelo princípio da unanimidade e que bloqueia a tomada de
decisões entre os 27 estados membros, como a possível entrada de outros países (como
ocorre com a Ucrânia e alguns países dos Balcãs) e os custos que tudo isto acarreta.
A relação com os Estados Unidos como garante da segurança europeia devido à NATO e
ao papel destes na reconstrução europeia após a II Guerra Mundial, levou à participação
dos países no Iraque e na Síria e o resultado foi desastroso. Tal como a possibilidade da
chegada ao poder da ala republicana em 2024, com uma tendência autoritária, e que
poderá colocar em causa a cooperação internacional e um abandono do multilateralismo.
No penúltimo capítulo, uma Segurança Diferente, debatem se as principais teorias das
Relações Internacionais e o modo como estas se enquadram num contexto e desafios
distintos. Quanto ao Realismo, no qual os Estados o egoístas e o sistema internacional
é anárquico, foi a teoria dominante no período da Guerra Fria.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 12, Nº. 1 (Maio-Outubro 2021), pp. 415-422
Recensão Crítica de Aguirre, Mariano (2023). Guerra Fria 2.0. Barcelona: Icaría.
ISBN 978-84-19200-76-1.
Paula Alfaiate da Luz
420
A corrente Liberal ou Kantiana centra se no quadro da cooperação, tendo a democracia
como o elemento perfeito para que esta se possa desenvolver e as organizações
internacionais, as ONG´S e a Sociedade Civil como fundamentais em todo este processo.
As restantes teorias das Relações Internacionais, “a construtivista, a marxista, a pós-
estruturalista, a pós-colonial e a de género” embora analisem de igual modo o sistema
internacional e possam influenciar as anteriores, o realismo e o liberalismo o as
predominantes nesta nova ordem mundial.
A preocupação em torno de uma “segurança comum”, foi “apresentada em 1982 pela
Comissão Independente sobre Desarmamento e Questões de Segurança, liderada pelo
então primeiro-ministro sueco Olof Palme”, a qual defendia que a segurança era um
direito de todos os cidadãos.
No ano de 1992, coincidente com o final da Guerra Fria, foi aprovado um importante
documento, A Agenda para a Paz, criado pelo à época Secretário Geral das Nações
Unidas, Boutros Boutrous Gali. Este foi o espoletar do papel do Direito Internacional
nos mais variados contextos, quer nos casos de genocídio e a relação entre soberania
nacional e a intervenção nos países quando estamos perante violações dos Direitos
Humanos.
A segurança, no momento presente, depara se com algumas dificuldades. Desde a falta
de investimento em novos modelos de intervenção, como a guerra cibernética, as armas
nucleares e a inteligência artificial, até aos interesses instalados nas empresas
fabricantes de armas e todos os que fazem parte deste modelo de negócio, assim como
quando, por motivos culturais, sociais e políticos, se sintam mais seguros pelas forças de
segurança.
E neste âmbito, tal como refere Aguirre, a prevenção de conflitos num sentido múltiplo
é uma via por onde começar para que o mundo não nos fuja das mãos.
Para finalizar, o décimo capítulo, O Futuro, a autor vaticina um futuro não muito
promissor. Tudo isto se deve às desigualdades sociais e económicas cada vez mais
acentuadas, apesar de todos os desenvolvimentos económicos e tecnológicos. Centrando
se na crise da democracia, no interesse dos Estados como benefício próprio e não como
solução para o bem comum, a asceno da extrema - direita, também referida
noutros capítulos, o poder das redes sociais no comportamento e controlo das sociedades
e o quanto estas podem desencadear movimentos racistas e xenófobos.
Aliado a tudo isto, a competição entre grandes e emergentes potências, a China, os
Estados Unidos, a Rússia, o Irão, a Turquia, a União Europeia, entre outros. Resultando
daqui diferentes conflitos consoante a capacidade militar, nuns casos mais associado à
guerra cibernética e noutros o terrorismo como controlador do Estado.
Paralelamente, o aumento da pobreza e da crise alimentar, fruto dos conflitos, das
alterações climáticas e das consequências sociais e económicas da pandemia COVID-19,
associado a um investimento cada vez maior no armamento e despesas militares, assim
como a competição pelos recursos energéticos (carvão e petróleo), as tecnologias verdes
(World Bank, 2023; Energy investment, 2023). O bem mais precioso que podemos ter,
a água potável, será igualmente promotora de uma disputa geopolítica cada vez mais
acentuada. (Bremmer. I.; Kupchan, C., 2023).
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 12, Nº. 1 (Maio-Outubro 2021), pp. 415-422
Recensão Crítica de Aguirre, Mariano (2023). Guerra Fria 2.0. Barcelona: Icaría.
ISBN 978-84-19200-76-1.
Paula Alfaiate da Luz
421
Reflexão sobre a obra
O autor ao longo da obra apresenta nos uma posição coerente face a todos os
acontecimentos. Embora não queira considerar na totalidade que estamos perante uma
nova Guerra Fria, existe uma correlação sucessiva de factos que nos transportam para a
década de 90 e a possibilidade de uma Guerra Fria 2.0, com novas alianças e desafios
internacionais.
Neste contexto, Monjardino considera todo este processo como a “crise dos trinta anos”
(2023: 355) e o de Grande Convergência” para nos descrever todos os
desenvolvimentos dos últimos quarenta anos. Aplicando os à ciência e tecnologia, à
globalização e aos recursos energéticos. (2023: 367-68). E para que compreendamos os
acontecimentos nos dias de hoje, é fulcral que avaliemos os factos em 4 regras: a regra
de Heródoto: “a geografia, a cultura e a história de um país ou território continuam a ser
essenciais na análise política”; a regra de Tucídides-Pobio, na qual “a principal ameaça
à sobrevincia de uma democracia liberal é sempre interna”; a regra Stendhal-Tolstoi,
sendo “extremamente difícil avaliarmos corretamente o verdadeiro significado dos
acontecimentos no momento em que têm lugar”; e a regra Donald Trump-Vladimir Putin,
nesta última, “devemos sempre suspeitar quando alguém afirma convictamente: «Isso
não faz sentido nenhum»”. (Monjardino, 2023: 15-16).
Mariano Aguirre argumenta com clareza os dados que aplica ao longo dos capítulos, assim
como analisa a história passada para compreendermos o presente e o que o futuro nos
reserva, sem alarmismos mas com a racionalidade que o realismo das Relações
Internacionais nos impõe, tornando a obra mais apelativa e desafiadora para o leitor. Um
livro que reflecte o humanismo do autor e fundamental para quem se interessa por todas
estas dinâmicas mundiais.
Referências
Bremmer. I. & Kupchan, C. Risk 10: Water Stress. Nova Iorque: Eurasia Group, 2023.
[Consult. 5 out. 2023]. Disponível em Eurasia Group | Water Stress: Eurasia Group's #10
Top Risk of 2023
International Energy Agency. Overview and Key findings. França, 2023. [Consult. 5 out.
2023]. Disponível em Overview and key findings World Energy Investment 2023
Analysis - IEA
Monjardino, M. (2023). Por Onde Irá a História? Lisboa: Clube do Autor. ISBN: 978-989-
724-633-3
O´Neill, J. Does an expanded BRICS mean anything. Londres: Chatham House, 2023.
[Consult. 5 out. 2023]. Disponível em
Does an expanded BRICS mean anything? | Chatham House International Affairs Think
Tank
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 12, Nº. 1 (Maio-Outubro 2021), pp. 415-422
Recensão Crítica de Aguirre, Mariano (2023). Guerra Fria 2.0. Barcelona: Icaría.
ISBN 978-84-19200-76-1.
Paula Alfaiate da Luz
422
The World Bank. Global Food and Nutrition Security Dashboard. Washington, 2023.
[Consult. 5 out. 2023]. Disponível em Food Security | Rising Food Insecurity in 2023
(worldbank.org)
Como citar esta recensão
Luz, Paula Alfaiate da (2021). Recensão Crítica de Aguirre, Mariano (2013). Guerra Fria 2.0.
Barcelona: Icaría. ISBN 978-84-19200-76-1. Janus.net, e-journal of international relations. Vol14,
Nº. 2, Novembro 2023-Abril 2024. Consultado [online] em data da última consulta,
https://doi.org/10.26619/1647-7251.14.01.1