OBSERVARE
Universidade Autónoma de Lisboa
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024)
407
NOTES AND REFLECTIONS
NOTAS SOBRE A UTILIZAÇÃO DAS CRIPTO MOEDAS NA AMÉRICA LATINA.
BREVE RESENHA DO CASO DE EL SALVADOR
1
ROSA MARIA RODRIGUES DE ABREU
rmrodriguezd@gmail.com
Candidata ao Doutoramento em Relações Internacionais: Geopolitica e Geoeconomia da
Universidade Autónoma de Lisboa (Portugal). Venezuelana lusodescendente, trabalhou na
Administração tributária venezuelana durante 25 anos e atualmente é especialista em tributação
internacional no rodster dos inspetores fiscais sem fronteiras.
Introdução
Esta nota pretende fazer uma abordagem do uso generalista das cripto-moedas na
América Latina, com muita maior frequência e quantia do que se utiliza em outras regiões
do mundo. O desenvolvimento desta moeda digital é muito recente, mas a falta de
regulação e controle gerou certa desconfiança em muitos países, e incluso alguns tem as
proibido. A Europa e os Estados Unidos careciam de regulamentação até o ano 2022.
Pelo contrário, na região da Arica Latina existe uma maior circulação, regulamentação
e aceitação, por isso é feita uma análise do desenvolvimento do uso e regulamentação
das cripto moedas na América Latina, como moeda e como meio de pagamento utilizado
para a compra de bens, serviços e ordenados.
Portanto, é necessário olhar o que está a acontecer com o uso das cripto-moedas na
América Latina e quais são as possíveis causas da popularidade delas, através da
experiência do “El Salvador”, que terá sido o primeiro dos países do mundo a estabelecer
a cripto moeda BITCOIN como sua moeda de curso legal. Por isso falamos da definição
de cripto-moeda e da sua forma de operar, para depois fazer uma muito breve análise
do tratamento das cripto moedas nos países mais desenvolvidos, o que nos leva logo a
focar a mirada na América Latina como a região do mundo onde houve um maior
crescimento na circulação das mesmas e um desenvolvimento avançado na
regulamentação. Em seguida, direcionaremos nosso olhar para o caso de El Salvador,
como o único país do mundo que reconheceu a cripto moeda como moeda de curso legal.
Encerramos a revisão da situação do uso dessa commodity como moeda de pagamento
de salários, bens e serviços na praia de El Zonte, conhecida como Bitcoin Beach, um
projeto pioneiro a nível mundial onde a cripto moeda BITCOIN foi introduzida como meio
1
Este ensaio foi elaborado no âmbito do Curso Avançado sobre o Continente Americano da Universidade
Autónoma de Lisboa, 2022.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 407-414
Notas e Reflexões
Notas sobre a utilização das crypto moedas na América Latina. Breve resenha do caso de El Salvador
Rosa Maria Rodrigues de Abreu
408
de pagamento. Concluímos com algumas considerações onde, com base nas
características próprias da região, apresentamos nossa opinião sobre o motivo desse
rápido crescimento em relação ao resto do mundo.
Atualmente há muito pouca bibliografia sobre esse tema, pois ainda é um fenômeno
muito recente, pelo que tivemos que nos basear em pesquisas de artigos publicados na
internet e nas regulamentações emitidas nos principais países da América Latina. No
entanto, consideramos que é um tema muito interessante e acreditamos que essas
experiências na região podem servir como modelo para desenvolver experiências
semelhantes em outras regiões do mundo em desenvolvimento.
Notas para uma definição de cripto moedas
A OCDE (2022), num recente estudo sobre a institucionalização dos ativos criptográficos,
afirma que não existe uma definição comumente acordada para ativos digitais, e o termo
é utilizado pela indústria financeira para abranger cripto ativos, valores de tokenizações
ou outros ativos, moedas estáveis, arranjos, moedas digitais do banco central (CBDC) e
outros instrumentos baseados em blockchain (como tokens” não fungíveis - NFT).
Também ressalta que as leis federais dos Estados Unidos definem o termo ativo digital
como um ativo emitido ou transferido por meio da tecnologia de blockchain ou livro-razão
distribuído (Distributed Ledger Technology - DLT), incluindo, entre outros, as chamadas
"moedas virtuais", "moedas" e "tokens".
2
O Centro Interamericano de Administrações Tributárias (CIAT 2022), assinala-se que a
definição de cripto ativos se refere ao uso de tecnologia de contabilidade distribuída com
segurança criptográfica e tecnologia similar, de modo que a definição também pode
abranger futuras classes de ativos de natureza funcionalmente similar. Essa definição
abrange ativos que podem ser mantidos e transferidos de forma descentralizada, sem a
intervenção de intermediários financeiros tradicionais.
3
De esses cripto-ativos, estamos
nos referindo às moedas virtuais ou cripto moedas. Assim, as cripto-moedas, cripto
divisas (do inglês cryptocurrency) ou cripto ativos, o transferidos por meio da
tecnologia blockchain. o ativos virtuais que o armazenados e transferidos na
internet, portanto, requerem uma carteira digital para armazenar o crédito.
Sendo um bem digital, o seu valor muda dependendo do seu uso e de como é
comercializado no mercado virtual, e embora as leis dos diferentes países definam essa
classe de ativos de diferentes maneiras, o seu comportamento é semelhante aos bens
negociados na Bolsa de Valores, estando dentro de um mercado menos regulado e com
maior risco, por não serem respaldadas por nenhuma autoridade monetária. Por isso, é
chamado de mercado alternativo ou descentralizado para distingui-lo do mercado
financeiro tradicional de valores
4
.
A primeira cripto-moeda criada (no ano de 2009) foi a Bitcoin. Posteriormente, surgiram
umas outras cripto moedas que tiveram maior ou menor desenvolvimento. As cripto-
2
Cf. OECD (2022), Institutionalisation of crypto-assets and DeFiTradFi interconnectedness, OECD
Publishing, Paris, https://doi.org/10.1787/5d9dddbe-en
3
Cf. (CIAT 2022) https://www.ciat.org/nuevas-reglas-para-el-intercambio-de-informacion-con-fines-
tributarios-respecto-de-los-criptoactivos/
4
Cf. OECD (2022), Institutionalisation of crypto-assets and DeFiTradFi interconnectedness, OECD
Publishing, Paris, https://doi.org/10.1787/5d9dddbe-en
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 407-414
Notas e Reflexões
Notas sobre a utilização das crypto moedas na América Latina. Breve resenha do caso de El Salvador
Rosa Maria Rodrigues de Abreu
409
moedas mais comuns são a Bitcoin, que foi a primeira e é a mais comumente usada em
operações institucionais; a Ethereum (mais recente e usado em contratos digitais
inteligentes e tokens não fungíveis - NFT); e o Tether, que pertence a uma subcategoria
chamada stablecoins, que fixa seu valor ancorado em outro valor mais estável e
conhecido, como o dólar.
Breve revisão do tratamento legal das cripto moedas
As cripto-moedas têm sido progressivamente utilizadas em todo o mundo e a falta de
regulamentação tem preocupado muitos governos. Nos Estados Unidos, foi introduzido
no Congresso um projeto de lei federal ainda em discussão chamado "Responsible
Financial Innovation Act" para regular as transações com cripto-moedas, concedendo
maiores poderes à Commodity Futures Trading Commission como órgão regulador desse
mercado descentralizado e fornecendo uma isenção de impostos para transações abaixo
de USD 200.00
5
.
Em 21 de setembro de 2021, a China proibiu todo o uso, transação, mineração ou
negociação de cripto moedas, com a intenção de evitar fugas de capital. Tornou-se assim
o primeiro país a condenar esse mercado digital. Além da China, outros países como a
Argélia, o Bangladesh, o Egito, o Iraque, o Marrocos, o Nepal, o Catar e a Tunísia
proibiram a atividade com cripto moedas.
Em abril de 2022, a União Europeia promulgou uma lei para proibir transações com cripto
moedas de forma anônima. Recentemente, a União Europeia aprovou o regulamento
sobre os mercados de cripto ativos (Regulamento MiCA - Markets in Crypto Assets) para
regular as transações com cripto moedas com o objetivo de proteger os consumidores e
reduzir os diversos riscos envolvidos nessas operações. Entre outras coisas, busca-se
que a Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados e a Autoridade
Bancária Europeia supervisionem a emissão dos tokens, e que as empresas
intermediárias que negociam cripto ativos informem os consumidores sobre os riscos e
custos envolvidos. Isso permitirá regulamentar as ofertas públicas de cripto ativos,
prevenir a manipulação do mercado, a lavagem de dinheiro, o financiamento do
terrorismo e outras atividades criminosas, além de atrair investidores institucionais, o
que irá impulsionar ainda mais esse setor.
O maior volume dos lucros nas transações com cripto ativos tem sido nos Estados Unidos
(US$ 47,0 bilhões em ganhos com cripto moedas) em comparação com o resto do mundo.
Na América Latina, observa-se um maior desenvolvimento tanto no uso quanto na
regulamentação das cripto moedas. A região da América Latina representa 9% das
transações globais desses ativos, e, de acordo com a Bloomberg, 8% dos cidadãos da
região investiram nelas, sendo a Argentina o país onde mais pessoas adquiriram cripto
moedas.
A Venezuela está na liderança do ranking de adoção de cripto ativos na região, sendo o
país latino-americano com maior adoção de cripto moedas (ocupa o sétimo lugar entre
154 países). Elas têm sido usadas para pagamento de salários e compra de diversos
bens. O segundo país latino-americano, de acordo com o mencionado relatório da
5
Cf. https://www.coindesk.com/policy/2022/06/07/key-us-senators-introduce-bill-outlining-sweeping-plan-
for-future-crypto-rules/?s=09
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 407-414
Notas e Reflexões
Notas sobre a utilização das crypto moedas na América Latina. Breve resenha do caso de El Salvador
Rosa Maria Rodrigues de Abreu
410
Chainalysis, é a Colômbia, que ocupa a 11ª posição mundial. Em seguida, aparece o
Brasil, na 14ª posição, depois o Peru, na 22ª posição, e a Argentina, na 28ª posição.
6
Na regulamentação do tópico na América Latina, a Argentina não tem qualquer norma
especifica e também não tem um órgão central de supervisão. No entanto, existe o
Decreto 796/2021, que estabelece pagamento de impostos para as empresas que
realizam transações com cripto moedas (carteiras virtuais) com o imposto sobre créditos
e débitos bancários. Também obrigações de informação sobre as transações, de
acordo com a Resolução 4164/2019 da Administração Federal de Impostos (AFIP). A lei
do Imposto as ganâncias estabelece como renda tributável o resultado da compra e
venda de "moedas digitais".
O Brasil está a tratar desde o ano de 2022 o projeto de lei 3825, apresentado pelo
senador do Partido Social Democrata, Irajá Abreu, que tem como objetivo trazer
transparência às operações e evitar a evasão fiscal e a lavagem de dinheiro. O projeto
ainda não foi aprovado e prevê que o órgão regulador seja o próprio governo do Brasil.
A Bolívia proibiu no ano de 2014 os cripto ativos por meio da Resolução de Diretoria
044/14 emitida pelo Banco Central da Bolívia (BCB), devido à falta de regulamentação,
riscos e casos de fraudes piramidais cometidos no país por plataformas chamadas Bitcoin
Cash e Pay Diamond. A proibição permanece em vigor até hoje, sendo o único país da
América Latina que proíbe essas transações.
Com relação a Colômbia, a Superintendência Financeira aprovou a Circular Externa 016
de 2021, que regulamenta as cripto moedas. Essa normativa estabelece um mecanismo
chamado sandbox, que são espaços controlados onde são realizados testes piloto de
novos modelos de negócios ainda não regulamentados. Além disso, foi estabelecida na
Resolução 314 a obrigação de relatar transações com cripto moedas à Unidade de
Informação e Análise Financeira (UIAF) acima de 150 dólares, com multas para o o
cumprimento dessa obrigação.
No Chile existem normas para a proteção dos consumidores e as cripto moedas são
consideradas ativos virtuais. Não há uma regulamentação específica, mas um projeto
de lei chamado "Bitcoin", que busca proteger proprietários e intermediários financeiros,
bem como as pessoas que interagem no mercado de moedas digitais. Nesse projeto, o
Banco Central do Chile é responsável pela regulamentação.
O Banco Central do Equador irá estabelecer a regulamentação dessa atividade com o
objetivo de evitar crimes como lavagem de dinheiro e fraudes. O presidente do Banco
Central esclareceu que não está previsto que seja uma moeda de curso legal no país.
No México existe uma Lei para Regulamentar as Instituições de Tecnologia Financeira,
conhecida como a Lei Fintech que data do ano 2018, a qual obriga a o Banco do México
a regular as cripto moedas. Não existe uma regulamentação específica para as cripto
moedas. Os provedores de serviços de cripto moedas devem se registar no Sistema de
Administração Tributária e relatar à Unidade de Inteligência Financeira para evitar a
lavagem de dinheiro.
6
Cf. https://www.bloomberglinea.com/2022/03/10/ranking-cripto-en-que-paises-de-la-region-hay-mayor-
uso-de-divisas-digitales/
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 407-414
Notas e Reflexões
Notas sobre a utilização das crypto moedas na América Latina. Breve resenha do caso de El Salvador
Rosa Maria Rodrigues de Abreu
411
No Panamá não regulamentação para cripto moedas. Foram apresentados dois
projetos de lei, um chamado Lei Cripto, que estabelece que os cripto ativos seriam um
método de pagamento global alternativo para qualquer operação civil ou comercial no
Panamá, e o outro chamado Lei 696, que recomenda a regulamentação do Bitcoin, Ether,
Tether e diferentes tipos de tokens, como NFT e 7UT.
No Paraguai um projeto de lei em discussão no Congresso desde 2021 para
regulamentar as atividades com cripto moedas. Esse projeto estabelece que as cripto
moedas não são moeda de curso legal, estabelece um registro para empresas
fornecedoras de ativos virtuais e regula a atividade de mineração de cripto moedas.
No Peru existe um projeto de lei Marco para a Comercialização de Cripto ativos, que
propõe a criação de um registo público de fornecedores de serviços cripto e a obrigação
de relatar "operações suspeitas" à Unidade de Inteligência Financeira. Esse projeto de lei
também não considera as cripto moedas como moeda de curso legal.
No Uruguai, a Câmara de FinTech criou uma Comissão de Cripto moedas no ano 2018.
Para o ano de 2021, o Banco Central do Uruguai (BCU) estabeleceu uma regulamentação
para serviços envolvendo ativos virtuais.
Na Venezuela existe legislação muito especifica. No ano 2018, foi sancionado o Decreto
Constituinte de Cripto ativos. Além disso, foi criado o token Petro, a primeira cripto
moeda criada por um Estado (das denominadas “moeda digital do Banco Central” ou
“CBDC Central Bank Digital Currence”), cujo valor está ancorado no preço do barril de
petróleo.
Esse decreto define os órgãos responveis pela regulamentação: Superintendência
Nacional de Cripto-ativos e Atividades Conexas (SUNACRIP): sua tarefa é regular as
atividades relacionadas a cripto ativos no país, bem como gerenciar sistemas de controle,
políticas e registo de usuários “Registro Integral de Serviços en Criptoativos (RISEC)”,
que é um sistema web vinculado à SUNACRIP no qual todos os usuários que realizam
atividades relacionadas as cripto moedas são registados; “Registro Integral de
Mineradores (RIM)” que é um aplicativo web vinculado à SUNACRIP no qual são
registados os usuários interessados em obter uma licença para a comercialização de
cripto ativos. Além disso, a Lei de Impostos sobre Grandes Transações Financeiras foi
reformada em fevereiro de 2022 para estabelecer um imposto de 2% a 20% sobre
operações com os cripto ativos. Há também uma Bolsa Descentralizada de Valores da
Venezuela (BDVE) que lida com transações de cripto ativos e é permitido pagar impostos
com cripto moedas conforme o Código Orgânico Tributário.
O exposto permite ver que a regulamentação das cripto moedas na Latino América é
muito ampla e mesmo queo seja uniforme, é muito mais especifica do que nos países
mais desenvolvidos.
A seguir, está o caso de El Salvador, que tem sido o primeiro país do mundo que
estabeleceu a cripto moeda como moeda de curso legal
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 407-414
Notas e Reflexões
Notas sobre a utilização das crypto moedas na América Latina. Breve resenha do caso de El Salvador
Rosa Maria Rodrigues de Abreu
412
A cripto moeda como moeda de curso legal. O caso de El Salvador
Em setembro de 2021, El Salvador tornou-se o primeiro país do mundo a adotar o Bitcoin
como uma moeda de curso legal. A legislação permite a aquisição de bens e serviços
utilizando o Bitcoin.
O Decreto Legislativo 57, conhecido como Lei Bitcoin, regulamenta o Bitcoin como
uma moeda oficial sem limites para fazer as transações, e estabeleceu que a taxa de
câmbio entre o Bitcoin e o dólar americano ia ser determinada livremente pelo mercado.
Os impostos podem ser pagos com Bitcoin, e os agentes econômicos devem aceitar o
Bitcoin como forma de pagamento. Em seguida, foram estabelecidas umas outras normas
complementares à Lei Bitcoin (Regulamento da Lei Bitcoin, Lei de Criação de Fideicomisso
Bitcoin, Normas Técnicas para Facilitar a Participação de Entidades Financeiras no
Ecossistema Bitcoin, Diretrizes para Autorização do Funcionamento da Plataforma
Tecnológica de Serviços com Bitcoin e dólares e Normas cnicas Temporárias sobre
medidas de Cibersegurança e Identificação de Clientes em Canais Digitais).
O atual Presidente de El Salvador, Nayib Bukele, também inaugurou o primeiro hospital
veterinário público financiado com parte dos lucros obtidos com os investimentos que o
governo tem feito em Bitcoin. Antes de adotar a cripto moeda como moeda de curso legal
no país, El Salvador realizou um projeto denominado “Bitcoin Beach” na praia de El Zonte.
O projeto “Bitcoin Beach” foi patrocinado pelo californiano Michael Peterson no ano de
2019. Peterson ia mais de 20 anos de férias com a família para a praia de El Zonte
para surfar. Em 2016, ele decidiu se mudar dos Estados Unidos para El Salvador e
angariou um financista para um projeto de caridade naquela região. O empresário
estabeleceu como condicionamento para suportar o projeto que a Bitcoin fosse a única
moeda utilizada nas transações. Foi assim que surgiu o Bitcoin Beach, um projeto que
tem sido o preâmbulo para a decisão do governo de estabelecer o Bitcoin como moeda
de curso legal.
A Praia El Zonte, está localizada cerca de 30 km a sudoeste da capital de El Salvador.
Nessa localidade, é possível pagar contas de água, eletricidade e televisão a cabo com
Bitcoins, comprar refeições, bebidas, pagar o hotel, as compras e até mesmo o corte de
cabelo. Além disso, existe um aplicativo de carteira virtual com o mesmo nome e até
mesmo uma caixa eletrônica multibanco de bitcoin. Dois anos depois da criação do
projeto, ainda existem 22 programas comunirios em andamento (como coleta de lixo
e atividades de nadadores salvadores) e algumas centenas de pessoas recebem os seus
salários em Bitcoin.
7
Conclusões
A utilização das cripto moedas na Arica Latina parece estar relacionado com a
desvalorização e volatilidade das moedas locais, além das dificuldades de acesso a
moedas estrangeiras como o dólar americano ou outras divisas. Isso pode explicar o
amplo desenvolvimento normativo em comparação com o resto do mundo e o volume de
7
Cf. Wilfredo Peña 'On Bitcoin Beach', turistas e residentes celebram a adoção de criptomoeda por El Salvador
Reuters https://www.reuters.com/technology/bitcoin-beach-tourists-residents-hail-el-salvadors-adoption-
cryptocurrency-2021-09-07/
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 407-414
Notas e Reflexões
Notas sobre a utilização das crypto moedas na América Latina. Breve resenha do caso de El Salvador
Rosa Maria Rodrigues de Abreu
413
transações realizadas com cripto moedas na região, por vezes mesmo mais alto que o
PIB do país.
Não há uma regulamentação unificada na América Latina, mas sim cada país optou por
estabelecer suas próprias normas, o que é um fenômeno comum e uma característica da
região. Na verdade, os acordos de integração existentes, como o Mercosul, a Comunidade
Andina de Nações, o Caricom, etc., não estabeleceram normas comunitárias para regular
o assunto ou mecanismos de controlo.
Alguns países possuem um maior desenvolvimento normativo, como é o caso da
Venezuela e do El Salvador, que possuem sistemas normativos muito avançados em
relação com os outros países. A utilização das cripto-moedas na América Latina tem sido
como meio para fazer pagamentos, ou como dinheiro digital, o qual é uma diferença
notável frente aos países mais desenvolvidos, que as utilizam como inversão
especulativa.
El Salvador chama a atenção por ser o primeiro país do mundo a estabelecer uma cripto
moeda como moeda de curso legal. O projeto Bitcoin Beach é uma iniciativa que
beneficiou uma população com problemas de pobreza e que encontrou nesse mecanismo
uma maneira de melhorar seu nível de vida.
A crise econômica gerada pela pandemia da COVID-19, que afetou severamente a região,
também pode ter impulsionado esse crescimento, pois muitas pessoas começaram a
prestar serviços desde a casa (teletrabalho, nómadas digitais) para outros países e
concordaram em receber o pagamento em cripto moedas para se protegerem da
desvalorização, do risco cambiário ou mesmo para ter aceso as divisas, (sobre tudo para
os casos da Venezuela e da Argentina, que tem fortes restrições para o mercado
cambiário), muitas vezes por o terem acesso a contas em moedas estrangeiras, como
o dólar.
A iniciativa da praia El Zonte, em El Salvador, pode ser um modelo a ser seguido pelos
outros países da região para melhorar o nível de vida da população afetadas pela
pobreza.
Referências
Organización para la Cooperación y el Desarrollo Económico OECD (2022),
Institutionalisation of crypto-assets and DeFiTradFi interconnectedness, OECD
Publishing, Paris, https://doi.org/10.1787/5d9dddbe-en consultado em 23 de junio de
2022.
Centro Interamericano de Administraciones Tributarias CIAT Nuevas reglas para el
intercambio de información con fines tributarios respecto de los criptoactivos
https://www.ciat.org/nuevas-reglas-para-el-intercambio-de-informacion-con-fines-
tributarios-respecto-de-los-criptoactivos/ consultado em 23 de junio de 2022
www.chainalysis.com consultado em 23 de junio de 2022
On-Chain Transaction Volumes Past Centralized Platforms June 6,
2022 https://blog.chainalysis.com/reports/defi-dexs-web3/
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 407-414
Notas e Reflexões
Notas sobre a utilização das crypto moedas na América Latina. Breve resenha do caso de El Salvador
Rosa Maria Rodrigues de Abreu
414
2021 Realized Cryptocurrency Gains by Country
https://blog.chainalysis.com/reports/cryptocurrency-gains-by-country-2021/
consultado em 23 de junio de 2022
https://www.bloomberglinea.com/2022/03/10/ranking-cripto-en-que-paises-de-la-
region-hay-mayor-uso-de-divisas-digitales/ consultado em 23 de junio de 2022
https://www.bitcoinbeach.com/ consultado em 23 de junio de 2022.
Como citar esta Nota
Abreu, Rosa Maria Rodrigues de (2023). Notas sobre a utilização das cripto moedas na América
Latina. Breve resenha do caso de El Salvador. Notes and Reflections in Janus.net, e-journal of
international relations. Vol. 14, Nº 2, Novembro 2023-Abril 2024. Consultado [em linha] em data
da última visita, https://doi.org/10.26619/1647-7251.14.2.03