OBSERVARE
Universidade Autónoma de Lisboa
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024)
322
UM MODELO DE COOPERÃO AVANT LA LETTRE PARA UMA EUROPA UNIDA.
AS PREMISSAS E A EVOLUÇÃO DA PEQUENA ENTENTE (1933)
MIRCEA ILIESCU
mircea.iliescu77@gmail.com
Doutorando no Instituto de História «Nicolae Iorga», Academia da Ronia (Roménia).
Prepara uma tese sobre a evolução da ideia europeia até ao momento da criação
da Comunidade Europeia, na década dos ’50. É diplomata, com mais de vinte anos de
experiência, principalmente na área dos assuntos europeus
Resumo
O fim da Primeira Guerra Mundial determinou mudanças estruturais no mapa da Europa,
resultantes da desintegração dos Grandes Impérios, girando em torno do modelo liberal e da
visão wilsoniana resumida nos «14 pontos». O novo modelo de construção da paz gerou, além
de benefícios claros, vários desafios, vividos de forma mais aguda pela Roménia e pelos
Estados da Europa Central e Oriental, principalmente motivados pela preservação do seu
status quo. A criação e evolução da Pequena Entente de uma estrutura predominantemente
defensiva para uma organização com características federativas proporcionam uma perspetiva
original. Prenuncia, como possível modelo e fonte de inspiração, a construção das
Comunidades Europeias na década de 1950. De particular relevância, pelo potencial de
exemplaridade, são a arquitetura institucional, os princípios de organização e o funcionamento
em regime de rotatividade e consenso, estabelecidos através do Pacto de Organização da
Pequena Entente (1933).
Palavras-chave
Europa, mudanças estruturais. Pequena Entente, características federativas, integração,
modelo potencial
Abstract
The end of the First World War determined structural changes on the map of Europe, resulting
from the disintegration of the Great Empires, revolving around the liberal model and the
Wilsonian vision summarized in the "14 points". The new model for building peace generated,
besides clear benefits, several challenges, more acutely experienced by Romania and the
states in Central and Eastern Europe, mainly driven to preserve the status quo. The creation
and evolution of the Little Entente from a predominantly defensive structure towards an
organization with federative characteristics provide an original perspective. It foreshadows,
as a possible role model and source of inspiration, the construction of the European
Communities in the 1950s. A particular relevance, for the exemplarity potential, are the
institutional architecture, the organization principles and the functioning on the basis of
rotation and consensus, established through the Organization Pact of Little Entente (1933).
Keywords
Europe, structural changes, Little Entente, federative characteristics, integration, potential
model
Como citar este artigo
Iliescu, Mircea (2023). Um modelo de cooperação avant la lettre para uma Europa unida. As
premissas e a evolução da pequena entente (1933). Janus.net, e-journal of international relations,
Vol14 N2, Novembro 2023-Abril 2024. Consultado [em linha] em data da última consulta,
https://doi.org/10.26619/1647-7251.14.2.15
Artigo recebido em 4 de Junho de 2023 e aceite para publicação em 18 de Setembro de
2023
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 322-340
Um modelo de cooperação avant la lettre para uma Europa unida. As premissas e a evolução
da pequena entente
Mircea Iliescu
323
UM MODELO DE COOPERAÇÃO AVANT LA LETTRE PARA UMA
EUROPA UNIDA. AS PREMISSAS E A EVOLUÇÃO DA PEQUENA
ENTENTE (1933)
MIRCEA ILIESCU
Introdução, objetivos e metodologia
A Pequena Entente
1
foi uma aliança formada em 1920 e 1921 pela Checoslováquia,
Roménia e o Reino dos Servos, Croatas e Eslovenos (a partir de 1929, Jugoslávia), contra
o revisionismo húngaro, que revindicava o norte da Croácia e da Voivodina (integrado no
Reino dos Servos, Croatas e Eslovenos), a Eslováquia e a Ruténia (cedidas à
Checoslováquia) e a Transilvânia e a parte oriental do Banat (reconhecidos como partes
da Roménia) e para impedir a restauração da monarquia dos Habsburgos.
A Pequena Entente foi iniciada por Edvard Beneš, ministro dos Negócios Estrangeiros da
Checoslováquia. Seu homólogo romeno, Take Ionescu, visava, em 1920, uma aliança
ainda mais extensa. A Pequena Entente foi originalmente uma organização defensiva
regional e surgiu com a assinatura de três convenções bilaterais: entre a Checoslováquia
e o Reino dos Servos, Croatas e Eslovenos (14 de agosto de 1920), a Roménia e a
Checoslováquia (23 de abril de 1921) e Romênia e o Reino dos Servos, Croatas e
Eslovenos (7 de junho de 1921).
Quanto aos objetivos, o presente trabalho debruça-se sobre a evolução estrutural e
organizacional da Pequena Entente, que levou, na década dos ’30, à mudança do seu
paradigma: de um modelo de segurança defensivo para um modelo federativo, o que
nos permitiu esboçar um paralelismo entre o seu Pacto de Organização e o Pacto da
Sociedade das Nações, apresentado por Aristide Briand.
Um outro objetivo que possa ser considerado original é a apresentação de um paralelismo
entre a Pequena Entente e a posterior estruturação e funcionamento da CEE e da União
Europeia. Postulámos a Pequena Entente de 1933 como um possível modelo de
cooperação avant la lettre da Europa Unida.
Quanto à metodologia, trata-se de uma revisão das fontes bibliográficas, a maioria do
Leste europeu, proporcionando uma visão sintética da organização e do funcionamento
1
A frase «Pequena Entente» foi usada ironicamente pela primeira vez num artigo do jornal húngaro Pesti
Hirlap (21.1.1920), com referência aos planos de colaboração entre a Roménia, a Checoslováquia e
Jugoslávia. Porém, o ser uso foi oficialmente adotado (Nanu, 1993: 81, nota 87).
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 322-340
Um modelo de cooperação avant la lettre para uma Europa unida. As premissas e a evolução
da pequena entente
Mircea Iliescu
324
da aliança (que desaparece em 1938, após os acordos de Munique). Sempre que possível,
revelamos uma documentação nova, resultante da pesquisa bibliográfica em vários
arquivos.
A Europa Central e Oriental após o Tratados de Versalhes
A Primeira Guerra Mundial teve um profundo impacto político, social e económico,
conduzindo à reconfiguração das relações interestatais na Europa, ao passar do rígido
sistema de «concerto» para outro paradigma organizacional, muito mais aberto e
inclusivo. A Europa do fim da guerra em nada se parecia com a de julho de 1914, os
quatro anos de conflito implicando profundas mudanças na sua configuração e na
fisionomia do mundo (René Rémond, 2002: 31). Como salientou Zara Steiner, a guerra
«pôs em marcha novas ideias e movimentos cujos tremores se fizeram sentir por toda a
Europa e fora dela. Mesmo onde as velhas elites permaneceram no poder, elas
enfrentaram um ambiente fundamentalmente alterado, tanto nos seus países como no
exterior, que exigia um arsenal mais amplo de respostas. Embora muitos dos modos
tradicionais de diplomacia permanecessem em vigor, novas técnicas e instituições eram
necessárias para lidar com a vasta expano do mapa e da agenda internacional. O
próprio conceito de um “sistema europeu de relações internacionais” foi destruído pelas
revoluções russas e pela participação americana na guerra» (Steiner, 2005: 1).
A configuração geopolítica do nosso continente passou por câmbios estruturais, e o
recém-criado mosaico político-territorial, na Europa Central e Oriental, tornou-se
sobrecarregado por interesses, fricções e dossiers sensíveis, desde a necessidade de
harmonização administrativa, às disputas fronteiriças e à questão das minorias. Apesar
da complexidade dos assuntos que tiveram de administrar, a Roménia e restantes
Estados emergidos do Império Habsburgo mostraram-se animados por um objetivo
primordial: manter o status quo do final da guerra, garantido pelos tratados, para impedir
a restauração do império dos Habsburgos (Scurtu, 2003: 436).
A Sociedade das Nações e a questão do revisionismo
A experiência da grande conflagração e os desafios da construção da paz criaram as
premissas favoráveis para uma nova dinâmica de relações na Europa e no mundo e para
um novo quadro alargado de debate a Sociedade das Nações, que constituiu uma nova
forma de organização dos Estados, uma verdadeira «institucionalização» das relações
internacionais. O sistema de Genebra marcou uma rutura com o sistema «ossificado» do
século XIX, baseado na diplomacia secreta, através da transição para a nova ordem
liberal com negociações abertas (Kennedy, 1987: 841-863). A versão final do Pacto
(Estatutos) da Sociedade das Nações, adotada por unanimidade em 28 de abril de 1919,
foi, portanto, lançada sob os auspícios favoráveis à cooperação e às negociações entre
os Estados, como fundamentos para uma paz duradoura.
As inovações da arquitetura institucional do fórum de Genebra principalmente a
existência de estruturas de representação permanentes ‒ podem ser consideradas uma
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 322-340
Um modelo de cooperação avant la lettre para uma Europa unida. As premissas e a evolução
da pequena entente
Mircea Iliescu
325
referência viável para o desenvolvimento de alianças de menor dimensão na Europa
Central e do Sudeste. Por outro lado, diminuía-se a capacidade da Sociedade das Nões
de agir, caso a ordem estabelecida em Versalhes fosse posta em causa. O disposto no
artigo 16.º do Pacto refere-se à possibilidade de avançar com sanções económicas, que
seriam obrigatórias e aplicadas automaticamente contra qualquer Estado agressor. No
entanto, as sanções militares permaneceram opcionais (Gerbert, 2012: 258). Parte-se,
ab initio, de uma deficiência estrutural, cujos efeitos se fariam sentir de forma aguda na
década dos 30 ‒ a falta do «braço armado».
O problema da insuficiência das garantias de segurança, tendência recorrente na
evolução do projeto europeu, inclusive após a constituição das Comunidades Europeias
na década dos ’50, resultou de um cúmulo de fatores e compromissos político-históricos
nas relações entre os «Grandes» e os «Pequenos». Nestas condições, a Roménia e outros
Estados da Europa Central e do Sudeste viram-se obrigados a construir um sistema de
alianças para compensar a falta de garantias de segurança principalmente das Grandes
Potências ‒ e ativá-lo quando um dos vizinhos revisionistas ‒ Hungria, Rússia Soviética
(desde 30 de dezembro de 1922, URSS) ou Bulgária teria tentado mudar o status quo
territorial, ignorando os tratados de paz e alterando as fronteiras (Constantiniu, 2010, p.
342-343).
A Roménia e a imperativa aliança regional
As ideias de cooperação aprofundada promovidas pela Roménia após a Primeira Guerra
Mundial, longe de permanecerem na esfera do idealismo ou desiderato estéreis,
manifestaram-se através de uma ação progratica, inserida e numa lógica política sem
as variações habitualmente criticadas na política dos Estados da Europa Central e
Oriental.
O governo romeno, mas particularmente o ministro dos Negócios Estrangeiros, Take
Ionescu, estiveram envolvidos na construção de uma aliança que deveria ter incluído os
Estados vitoriosos da região, do Mar Báltico ao Mar Egeu: Ponia, Checoslováquia,
Roménia, Jugoslávia e Grécia. Assim, antes da Conferência de Aix-les-Bains (1920), Take
Ionescu declarou à imprensa estrangeira que a aliança iria formar “um bloco de oitenta
milhões de habitantes e dez milhões de soldados
2
”. O projeto apresentado por Take
Ionescu visava criar um “cordão sanitário” contra um possível ataque da Rússia
bolchevique, que se tinha tornado um potencial agressor, mas visava igualmente isolar
a Hungria e a Bulgária revisionistas.
Usufruindo das oportunidades de cooperação a todos os níveis ‒ internacional, regional,
bilateral ‒, a presença em Genebra e, sobretudo, o ativismo na construção de uma rede
de alianças bilaterais ou regionais, representaram uma terceira via na política externa da
Roménia no período entre guerras.
Evidentemente, a ultima ratio destas etapas permanecia a tutela dos grandes interesses
nacionais, o que não excluía a experimentação de diversas formas de cooperação, por
2
Journal des débats politiques et littéraires, ano 132, n.º 254, 14.9.1920, p. 1.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 322-340
Um modelo de cooperação avant la lettre para uma Europa unida. As premissas e a evolução
da pequena entente
Mircea Iliescu
326
vezes até inéditas, que rompiam a clássica esfera defensiva, através da intervenção em
vários domínios, desde a economia aos transportes, agricultura, comunicações, diálogo
interuniversitário e intercâmbios de estudantes.
Acreditamos que o processo de transformação da Pequena Entente de uma aliança
defensiva numa estrutura cooperativa, com poderes federativos, é emblemático da
política de alianças promovida, após a Primeira Guerra Mundial, pela Roménia e os seus
aliados interessados na preservação do status quo. É difícil decantar os recursos político-
estratégicos: capacidade, sentido de oportunidade histórica ou reflexo imposto pela
evolução do quadro regional e europeu estável, por um período limitado, na década dos
’20, mas cada vez mais volátil após a Grande Depressão que eclodiu em 1929.
As ideias de cooperação reforçada promovidas pela Roménia, longe de ficarem na esfera
do idealismo estéril ou do desiderato geral, manifestaram-se através de uma ação
programática, implementada com cuidado, numa lógica política sem as variações
habitualmente censurados na política dos Estados da Europa Central e do Sudeste. Estas
ideias são subsequentes ao primeiro desígnio, o cultivo do interesse nacional não
através de visões autárquicas, mas valorizando a mais-valia da cooperação e integração
e simbolicamente circunscritas pela fórmula metafórica «espiritualização das
fronteiras», lançada pelo político romeno Nicolae Titulescu
3
. A «espiritualização das
fronteiras», longe de postular o desaparecimento das fronteiras ou a transferência total
da soberania, enfatizava a mais-valia da integração, da cooperação como patamar
superior de valorização dos interesses nacionais, através da harmonização das ões
políticas e da cooperação gradual com parceiros nas mais diversas áreas.
O dinamismo da Pequena Entente, desde o momento da sua criação a a sua plena
maturidade, na década dos ’30, reflete a superação relativamente rápida do limiar
defensivo e a abertura sempre crescente em prol de uma cooperação reforçada.
Os atos fundadores da Pequena Entente a Convenção de Aliança entre a República
Checoslovaca e o Reino dos Sérvios, Croatas e Eslovenos (14 de agosto de 1920)
4
, a
Convenção de Aliança Defensiva entre o Reino da Roménia e a República Checoslovaca
(23 de abril de 1921)
5
e a Convenção de Aliança Defensiva entre o Reino da Roménia e
o Reino dos Sérvios, Croatas e Eslovenos (7 de junho de 1921)
6
refletiam,
predominantemente, mas não de forma exclusiva, o primeiro nível da cooperação o
defensivo.
Na avaliação da França, a aliança dos ts Estados foi-se fortalecendo à medida que esses
garantissem os «interesses especiais» uns dos outros. O aspeto mais importante do
ponto de vista dos interesses franceses consistia no facto de que uma aliança assinada
3
Nicolae Titulescu (1882-1941), foi ministro dos Negócios Estrangeiros em rios gabinetes (1927-1928,
1933-1934, 1934-1936). Envolvido desde a criação da Sociedade das Nações, foi muito ativo nos debates
do fórum de Genebra, exercendo sucessivamente o cargo de Presidente em 1930 e 1931.
4
Arhiva Ministerului Afacerilor Externe al României (a seguir AMAER), Fundo 71/1920-1944, Dossiers
Especiais, Checoslováquia C1, dossier 16, Tratado de aliança com a Roménia, 1920-1929, fs. 7-9.
5
Monitorul Oficial, n.º 53, 11 de junho de 1921.
6
Monitorul Oficial, n.º 77, 10 de julho de 1921.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 322-340
Um modelo de cooperação avant la lettre para uma Europa unida. As premissas e a evolução
da pequena entente
Mircea Iliescu
327
por Pasič, Beneš e Titulescu «não pode funcionar contra nós»
7
. O denominador comum
das três convenções era a posição antirrevisionista. Enquanto as duas primeiras
convenções visavam combater um único Estado com potencial revisionista a Hungria -
, a terceira convenção, a romeno-jugoslava, era a mais complexa. Referia-se a dois
Estados potencialmente agressores que mostravam insatisfação com as disposições
dos tratados de paz. Outra diferença notável relacionava-se com os documentos anexos
8
:
três atas e dois protocolos, que incluíam disposições destinadas a regular um amplo leque
de problemas, desde a delimitação de fronteiras, ao estatuto das minorias, uma série de
questões relativas ao comércio, transporte ferroviário, correios, à criação de escolas e
igrejas para as comunidades étnicas.
A Pequena Entente: integração e novas ameaças
As disposições das convenções criaram um campo de atuação mais amplo noutros
domínios, que poderiam ser abordados de outra forma, uma vez resolvidas as
divergências bilaterais. A regulação do comércio, do transporte ferroviário ou dos correios
poderia permitir o desenvolvimento de políticas regionais, assumindo-se como modelo
possível de replicação, ainda que em maior escala, na Europa.
O período 1922-1926 diz respeito basicamente à consolidação da segurança regional
9
.
As decisões adotadas nas conferências da Pequena Entente decorreram da premente
necessidade dos três aliados em fortalecer o quadro da estabilidade regional.
O ano de 1927 foi um marco no desenvolvimento da Pequena Entente, ao testar a
capacidade de integração das economias dos três Estados. A conferência do Conselho
Permanente, realizada em Jáchymov, entre 13 e 15 de maio de 1927, ocorreu num
contexto marcado pelo Anschluss, a política agressiva dos italianos contra o Reino dos
Sérvios, Croatas e Eslovenos e a apatia britânica em relação ao Centro e Sudeste europeu
(Campus, 1977: 97-98). Um aspeto de particular relevância abordado foi a possibilidade
de consolidar efetivamente a Pequena Entente através de um plano económico comum.
Os especialistas dos três Estados deveriam propor formas eficazes e realistas de
cooperação mutuamente benéfica, incluindo a expano da cooperação entre todos os
Estados do Danúbio (Vanku, 1986: 42-43). A decisão dos três aliados de aprofundar a
cooperação com base na dimensão económica resulta de uma evolução orgânica da
Pequena Entente, no espírito das convenções fundadoras, que, como mostrámos,
continham, in nuce, a base da integração das suas políticas.
A conferência de Bucareste de 20 a 22 de junho de 1928 visou a possibilidade de estender
a colaboração económica à Hungria, Áustria e, possivelmente, à Polónia, por meio de
7
Cf. Clément-Simon, ministro da França em Belgrado para Briand, ministro dos Negócios Estrangeiros, 10
de junho de 1921, în Ministère des Affaires Étrangères, Commission de Publication des Documents
Diplomatiques Français, Documents Diplomatiques Français (a seguir DDF), tomo I, 16 de janeiro -30 de
junho de 1921, pp. 744-746, doc. 465.
8
Ibidem.
9
No respetivo intervalo, a Pequena Entente organizou conferências em Marienbad (25 de agosto de 1922),
Praga (27 a 28 de agosto de 1922), Sinaia (28 de julho de 1923), Belgrado (10 a 12 de janeiro de 1924),
Praga (11 de julho de 1924), Bucareste (9 a 10 de maio de 1925), Timisoara (11 de fevereiro de 1926).
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 322-340
Um modelo de cooperação avant la lettre para uma Europa unida. As premissas e a evolução
da pequena entente
Mircea Iliescu
328
incentivos alfandegários com efeitos benéficos gerais (Vanku, 1986: 43). Com base nisso,
a Conferência para Problemas Económicos que teve lugar em Bucareste, em 20 de
fevereiro de 1929, abrangeu uma série de assuntos, desde as formas de estimular a
cooperação económica, a agricultura, até à universidade, através de intercâmbios de
professores e alunos, transporte e outros
10
. A cooperação deveria cumprir as resoluções
da Conferência Internacional de Genebra e basear-se em princípios bastante avançados,
como: a livre circulação, a igualdade de tratamento entre o Estado e as empresas
privadas, as condições de trabalho, etc.
11
As propostas concretas de integrar a cooperação dos três Estados num amplo leque
temático e a abertura à cooperação com a Hungria e a Áustria, por meio de uma série
de facilidades, principalmente económicas, trouxeram benefícios diretos mútuos,
decorrentes dos esforços de harmonização das políticas agrícola ou industrial. O efeito
indireto, igualmente importante, consistiu no reforço potencial da estabilidade regional,
diminuindo o revisionismo húngaro ou o perigo do Anschluss, através da capitalização
política das alavancas e das vantagens económicas.
Por ocasião da conferência da Pequeno Entente em Štrbské Pleso (25 a 27 de junho de
1930), o ministro dos Negócios Estrageiros da Roménia, George G. Mironescu, enfatizou
que, na opinião comum dos três, os efeitos da crise económica na Europa poderiam ser
atenuados por medidas como o agrupamento de diferentes países em uniões regionais,
«ou seja, a criação da Pequena Entente Económica, com tendência a estender o
entendimento económico também a outros Estados
12
». Na mesma ocasião, foi debatido
e aprovado um projeto de acordo sobre os Estatutos da Pequena Entente, que consagrou
as regras aplicadas até então em vários aspetos, como a organização de conferências
anuais em cada Estado-Membro. Segundo o ministro Mironescu, isso representava o
primeiro «acordo político comum entre os três Estados, que estão vinculados por tratados
separados. Desta vez o tratado é comum e dá um caráter mais completo e sólido à
aliança tripartite!
13
».
As decisões adotadas em Jáchymov, Bucareste e Štrbské Pleso marcaram, portanto, um
ponto de virada na transformação da Pequena Entente e o primeiro passo da aliança, que
se encontrava num processo de transição, em direção a uma nova fórmula conceitual e
de ação a nível europeu.
Em 11 de dezembro de 1932, como resultado da atitude condescendente da França e,
sobretudo, da Grã-Bretanha e de outras potências, a Alemanha tornou-se beneficiária da
declaração dos «Cinco Grandes», que estabeleceu a Gleichberichtigung (Chiper, 2000:
49).
Para a Roménia e os seus aliados esta decisão representou um forte inconveniente. A
cooperação entre as cinco Grandes Potências e a resolução aprovada foram consideradas
pelos Pequenos Aliados um sinal acerca da provável criação de um novo diretório na
Europa (Mićić, 2020: 48). As preocupações não eram infundadas, sendo a possibilidade
10
AMAER, Fundo Pequena Entente, anos 1920-1935, vol.1, fs. 107-108.
11
Idem, vol. 10, telegrama circular n.º 31394, Bucareste, 7 de junho de 1936, assinada por N. Titulescu.
12
Ibidem, ano de 1930, vol. 8, f. 129.
13
Ibidem, f. 130.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 322-340
Um modelo de cooperação avant la lettre para uma Europa unida. As premissas e a evolução
da pequena entente
Mircea Iliescu
329
de constituição de um diretório europeu, com a participação dos Grandes, mencionada
por Mussolini, em outubro de 1932, num discurso proferido em Turim (Brighi, 2013: 69;
Carmi, 1972: 208).
A Conferência de Belgrado e o processo da reestruturação da Pequena
Entente
A renomeação de Nicolae Titulescu à frente do Ministério dos Negócios Estrangeiros, em
outubro de 1932, permitiu uma atuação mais dinâmica e efetiva da diplomacia romena
e da Pequena Entente (Chiper, 2000: 48). Titulescu enfatizou que seu primeiro objetivo
após assumir a pasta ministerial era fortalecer os laços da Pequena Entente para que, se
algum membro fosse atacado por um de seus vizinhos, o atacante se tornasse, ipso jure,
inimigo de toda a Pequena Entente (Titulescu, 1994: 71).
Por ocasião da Conferência da Pequena Entente, de 18 a 19 de dezembro de 1932,
organizada em Belgrado, Jevtić, Beneš e Titulescu descobriram que o estabelecimento
de um diretório das Grandes Potências colocaria em perigo a Pequena Entente,
alimentando tendências revisionistas alemãs, húngaras e búlgaras (Mićić, 2020: 48). A
Europa Central e do Sudeste enfrentava um possível abandono francês num momento
em que a Alemanha estava a rearmar-se, e Mussolini, por sua vez, agitava os Balcãs
(Steiner, 2005: 793). No comunicado final da Conferência da Pequena Entente, foi
enfatizada a necessidade de uma atuação cada vez mais estreita em questões políticas
e económicas e a decisão dos três de adaptar a organização às exigências do momento,
complementando os Estatutos
14
.
A criação e o funcionamento do Conselho da Pequena Entente e do seu Secretariado
Permanente, a partir do modelo existente na Sociedade das Nações, representavam
inovações institucionais e conferiam uma outra faceta à aliança (Campus, 1997: 114-
115; Vanku, 1979: 80). Ao contrário da fórmula organizacional discutida em Štrbské
Pleso, o quadro jurídico-institucional acordado em Belgrado previa uma política externa
única e a consolidação da Pequena Entente para que esta seguisse uma política externa
independente das Grandes Potências, incluindo a França (Mićić, 2020: 48).
A evolução da situação internacional, que já havia evidenciado uma série de deficiências
no sistema de organização da paz, e as limitações do fórum de Genebra, especialmente
face à invasão da Manchúria pelo Japão, em setembro de 1931, às tenncias agressivas
da política alemã, às manifestações fascistas da Itália, ao revisionismo da Hungria, bem
como ao espectro do diretório dos Quatro Grandes, que não augurava nada de bom para
os Estados da Europa Central e do Leste, determinaram a decio dos Pequenos Aliados
de basear a sua arquitetura político-institucional sobre novos alicerces da Pequena
Entente.
No espírito de plena solidariedade, na Conferência de Belgrado, decidiu-se a
reestruturação da Pequena Entente de uma aliança predominantemente defensiva para
14
D.D.F., 1932-1939, 1.ª
Série (1932-1935), vol. II, 15 de novembro de 1932 17 de março de 1933, pp.
296-297, doc. 128 (Naggiar para Paul-Boncour, 22 de dezembro 1932).
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 322-340
Um modelo de cooperação avant la lettre para uma Europa unida. As premissas e a evolução
da pequena entente
Mircea Iliescu
330
uma organização sui generis: uma entidade regional com poderes federais, munida de
instrumentos institucionais e legais, capaz de atuar como um novo ator no palco europeu
e internacional.
A reação da Pequena Entente traduziu-se tanto numa política reativa, antirrevisionista,
como numa constante abordagem preventiva. Assim, o novo quadro institucional e de
atuação foi garantir um comportamento previsível e unitário dos três e a eliminação de
potenciais desavenças nas relações entre si ou no diálogo de cada um com terceiros.
Com a instauração da ditadura nazista em 30 de janeiro de 1933, o quadro geopolítico
tornou-se mais imprevisível. A política externa da Alemanha perseguiu ativamente a
realização do programa anunciado em Mein Kampf, tendo como principais objetivos a
recuperação da força militar, a anexação à Alemanha de outros territórios habitados por
alemães, a conquista de um «espaço vital», o mais amplo possível, especialmente na
Europa Oriental, bem como o estabelecimento de uma área de controle e domínio
económico Wirtshchaftsraum (Chiper, 2000: 49).
Nas condições em que as potências revisionistas «testava a ordem jurídica
estabelecida em Versalhes, baseada numa arquitetura político-jurídica construída no pós-
guerra, a Roménia encontrava-se praticamente na confluência de pressões em todos os
seus flancos. Para mitigar possíveis sobressaltos e riscos decorrentes das deficiências do
seu sistema de alianças e das novas tendências do revisionismo e expansionismo alemão,
da vontade da Itália de se afirmar como polo de poder concorrente da França e do perigo
soviético, a Roménia viu-se obrigada a desenvolver, juntamente com os seus aliados,
soluções criativas, na linha do Estado de direito e dos interesses fundamentais, no reforço
da segurança nacional, na promoção da paz duradoura e na luta contra o revisionismo.
Salto para um paradigma federativo: o Pacto para a Organização da
Pequena Entente
Em 16 de fevereiro de 1933, os ministros dos Negócios Estrangeiros dos três países,
Nicolae Titulescu, Edvard Beneš e Bogoliub Jevtić, assinaram o Pacto para a Organização
da Pequena Entente (Titulescu, 1967: 471-473). Através da nova fórmula, a aliança
contribuiu para os esforços de paz e segurança na Europa, respondendo a «uma dupla
ameaça: o revisionismo dos antigos adversários e a duplicidade dos presentes» (Chiper,
2000: 52).
A ameaça de um entendimento das Grandes Potencias em apenas um mês Mussolini
lançaria o Pacto das Quatro Grandes Potências ‒ foi sentido de forma aguda e contribuiu
para a decisão dos Pequenos Aliados de se reorganizarem para enfrentar um possível
acordo que iria contradizer a atitude antirrevisionista dos pequenos países. Com
referência ao aprofundamento da cooperação dos Pequenos Aliados, ao assinar o Pacto
de Organização, no contexto da potencial da ameaça do Diretório dos Quatro, Titulescu
declarava mais tarde: «Em fevereiro de 1933, Beneš, Jevtić e eu, que sabia
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 322-340
Um modelo de cooperação avant la lettre para uma Europa unida. As premissas e a evolução
da pequena entente
Mircea Iliescu
331
perfeitamente o que iria acontecer em março de 1933, decidimos assinar o pacto que
você conhece
15
».
A componente defensiva manteve-se no núcleo constitutivo, mas foi enquadrada numa
perspetiva muito mais ampla de ação político-diplomática, que viria a ser desenvolvida
pela integração progressiva das políticas dos ts.
A realização de uma arquitetura institucional inovadora, baseada na observância das
regras e princípios de igualdade, rotatividade e unanimidade garantia o enquadramento
político e institucional da Pequena Entente, como organização regional de aspeto
federativo.
No preâmbulo do Pacto de Organização
16
, foram mencionados os principais objetivos da
organização: salvaguarda da paz «em todas as circunstâncias», intensificação das
relações económicas com todos os Estados e, em particular, com os da Europa Central,
estabilização política da Europa Central, manutenção da status quo, respeitando os
interesses comuns daquele espaço. Os três decidiram dar às relações de amizade e
aliança «uma base orgânica estável», «unificando completamente a sua política geral»,
formando «uma unidade internacional superior», aberta a outros Estados nas condições
estabelecidas em cada caso individualmente.
Notamos a importância dada, desde os primeiros parágrafos do Pacto de Organização,
aos esforços de unificação da política geral, elemento que refletiu a decisão política dos
três países em conferir à aliança um perfil com fortes traços federativos. A intensificação
da cooperação económica com todos os Estados, com especial destaque para os da
Europa Central, circunscreveu-se quer ao interesse comum de reforço do papel da
organização, inclusive enquanto «unidade internacional superior», quer à abordagem
tática de utilização da alavanca económica para tensionar o ambiente regional e uma
possível mitigação das pressões revisionistas, particularmente da Hungria.
Os três primeiros artigos do pacto foram dedicados à criação do Conselho Permanente,
integrado pelos ministros dos Negócios Estrangeiros dos três países ou por delegados
especialmente designados para esse fim, constituído como órgão dirigente da política
comum do grupo de três Estados (art1.º). Foi estabelecido o princípio da rotatividade,
segundo o qual o Conselho deveria reunir-se obrigatoriamente pelo menos três vezes ao
ano, tendo as reuniões lugar em cada um dos três Estados, alternadamente, e mais uma
em Genebra (art 2.º).
Seria nomeado presidente do Conselho Permanente o ministro dos Negócios Estrageiros
do Estado onde se deveria realizar a reunião anual obrigatória, cabendo a esse ministro
estabelecer a data, o local, a agenda e preparar as decisões a ser adotadas. O presidente
permanecia no cargo até a primeira reunião obrigatória do ano seguinte (art.º 3.º).
15
Serviciul Arhive Naționale Istorice Centrale (SANIC), Fundo MPN, informações, dossier 474, f. 4, apud
Chiper, 2000: 54.
16
AMAER, Fundo Acordos e Convecções. Pequena Entente, 8, dossier 1/1933.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 322-340
Um modelo de cooperação avant la lettre para uma Europa unida. As premissas e a evolução
da pequena entente
Mircea Iliescu
332
A igualdade absoluta e de facto dos três Estados representava o princípio básico no
debate de todos os assuntos e no processo decisório, seja nas relações entre si, seja no
que diz respeito a relões com terceiros (art.º 4.º).
Também foi estabelecido o princípio da representatividade, podendo o Conselho
Permanente decidir que, em determinado assunto, a representação ou a defesa do ponto
de vista dos Estados aliados seja confiada a um único delegado ou à delegação de um
único Estado (art.º 5.º).
A nova estrutura institucional da aliança replicava, em certa medida, a da Sociedade das
Nações, com o reforço da dimensão igualitária. Como mostrámos anteriormente, o
Conselho da Sociedade das Nações era no início composto por representantes das
Grandes Potências, sendo posteriormente ampliado, em 1922 e 1926, a fim de
compensar os desequilíbrios de representação dos Estados «pequenos e médios».
Todos estes elementos relativos à organização das reuniões do Conselho Permanente
apresentam inúmeras semelhanças com o atual princípio de rotatividade da Presidência
do Conselho da União Europeia
17
.
A falta de um parlamento foi compensada pelo princípio da adoção de decisões por
unanimidade, suscevel de evitar possíveis «deslizes» no âmbito da Pequena Entente.
Os três aliados estabeleceram a regra da unanimidade, segundo a qual qualquer tratado
ou ato unilateral que tivesse mudado a situação política de um dos Estados-Membros
com um terceiro, bem como qualquer acordo económico com importantes consequências
políticas, exigiam o consentimento unânime do Conselho da aliança.
Previa-se também a progressiva unificação dos tratados políticos de cada um dos ts
com terceiros Estados (art.º 6.º) outro elemento que indicava a propensão dos Aliados
para uma organização de tipo federal. A nova regra, baseada no direito de veto nas
decisões políticas, deu garantias adicionais especialmente à Roménia. Segundo Titulescu,
a Roménia encontrava-se na posição de ficar isolada no caso de um ataque da Rússia
soviética, já que a Checoslováquia e a Jugoslávia tentavam constantemente livrar-se da
responsabilidade de uma possível intervenção. Na conceção de Titulescu, o direito de
veto não deveria de forma alguma levar a uma oposição permanente, mas sim permitir
uma resposta positiva, que «o direito de apresentar condições que levem em conta
os interesses da Roménia para garantir a manutenção e destino do Pequena Entente
como importante entidade internacional (Titulescu, 1994: 71)».
Verifica-se que o núcleo de princípios fundamentais para o funcionamento das
Comunidades Europeias e, atualmente, para a atividade da União Europeia, tem um
modelo equivalente e precursor nas disposições do Pacto de Organização da Pequena
Entente.
17
A Presidência do Conselho da União Europeia é atualmente exercida rotativamente, por cada Estado-
Membro da UE, por um período de seis meses. Pelo Tratado que instituiu a Comunidade Europeia do Carvão
e do Aço (1951), a rotação passou a ser prevista para intervalos de três meses, mas no Tratado da
Comunidade Europeia da Energia Atómica (1957) e no Tratado da Comunidade Económica Europeia (1957)
a duração passou a ser de 6 meses. Esta periodização foi mantida no Tratado de Bruxelas Tratado de
Fusão», 8 de abril de 1965) e nos tratados posteriores até o presente.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 322-340
Um modelo de cooperação avant la lettre para uma Europa unida. As premissas e a evolução
da pequena entente
Mircea Iliescu
333
Por exemplo, o Conselho Permanente, órgão dirigente da Pequena Entente, constituído
pelos ministros dos Negócios Estrangeiros, tem correspondente nas várias formações
ministeriais do Conselho da UE, que se reúnem regularmente para debater temas de
interesse em áreas espeficas: relões exteriores, agricultura, transportes, energia,
ambiente, etc. O princípio da igualdade e representatividade encontra-se
transversalmente na atividade de todas as atuais instituições europeias. Outro princípio,
o da rotatividade, é respeitado no exercício da Presidência do Conselho da União
Europeia, que é exercida por cada Estado-Membro da União Europeia por um período de
seis meses, com base num calendário.
Uma componente inovadora: o Conselho Económico
Ao fortalecer a componente económica, a Pequena Entente ampliou o seu objetivo e
agregou novos valores ao processo transformador. Assim, para efeitos da coordenação
progressiva dos interesses económicos nas relações entre si ou com terceiros, foi criado
o Conselho Económico da Pequena Entente, composto por especialistas e peritos, como
órgão consultivo auxiliar do Conselho Permanente na sua política geral (art 7.º).
A decisão de aprofundar a cooperação económica adquiriu um caráter formal por meio
da criação do Conselho Económico, fórmula institucional inovadora. As tarefas do novo
órgão foram posteriormente estabelecidas na reunião do Conselho Permanente em
Praga, de 29 de maio a 1.º de junho de 1933.
A organização e atuação do Conselho Económico ilustram, no plano técnico
impressionante pela abranncia de temas ‒, a funcionalidade da Pequena Entente como
órgão potencialmente federativo.
O Conselho era composto por três seções nacionais, cada uma com cinco membros, e o
trabalho deveria ser desenvolvido tendo em conta aspetos gerais: potica comercial,
questões agrícolas, financeiras, crédito, questões bancárias. O Conselho Económico
previa nos seus estatutos a colaboração dos três Estados em todas as áreas da economia
e devia informar o Conselho Permanente sobre as decisões tomadas e a atividade
desenvolvida, que incluía direitos aduaneiros, regime preferencial, regime de
pagamentos e quotas, a elaboração de planos de colaboração, tendo em conta os
interesses de cada um dos aliados. As tarefas do Conselho Económico incluíam também
o estabelecimento de relações entre institutos agrícolas, a introdução do sistema de
colaboração e a celebração de acordos na indústria e no domínio dos investimentos, a
criação de câmaras mistas de comércio, a unificação e regulamentação do transporte
ferroviário, uma colaboração mais estreita no domínio da navegação no Danúbio, no
tráfego aéreo e nas ligações correios-telégrafo-telefone, a uniformização de algumas
regulamentações, especialmente de direito comercial, a simplificação das tarifas
aduaneiras, a abolição de vistos e passaportes (Vanku, 1979: 93-94) os princípios
fundamentais da livre circulação, que asseguraram a fundação das Comunidades
Europeias e da União Europeia atual. A primeira reunião do Conselho Económico foi
realizada entre 9 e 11 de janeiro de 1934, em Praga, no âmbito de cinco comissões:
troca de mercadorias, transportes, navegação no Danúbio, conexões correios-telégrafo-
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 322-340
Um modelo de cooperação avant la lettre para uma Europa unida. As premissas e a evolução
da pequena entente
Mircea Iliescu
334
telefone, assuntos financeiros, colaboração entre bancos emissores. Foram adotadas
medidas para fortalecer as relações económicas, com aumento de 50% nas exportações
jugoslavas e romenas para a Checoslováquia, em relação a 1932, e o estabelecimento
do limite mínimo de importações checoslovacas da Roménia e da Jugoslávia em 250
milhões de coroas e 275 milhões de coroas, respetivamente. O Conselho Económico
adotou também a decisão da reunião trimestral das três delegações (Vanku, 1979: 94-
95).
O Pacto da Organização da Pequena Entente vs. o Memorandum de
Briand
Notamos a colocação sob o «guarda-chuva» da organização, de acordo com o artigo 10.º,
da política comum do Conselho Permanente, inspirada nos princípios gerais incluídos nos
principais tratados adotados a nível internacional, como o Pacto da Sociedade das
Nações, o Pacto de Paris (Pacto Kellogg-Briand), o Ato Geral de Arbitragem (Genebra,
1928), convenções de desarmamento: os Tratados de Locarno.
Numa abordagem paralela, entre o Pacto da Organização da Pequena Entente e o Pacto
da Sociedade das Nações existem pontos comuns, mas também uma série de aspetos
divergentes.
A Pequena Entente tinha princípios claros, baseados na plena equidade no processo
decisório, na regra da rotatividade nas reuniões do Conselho Permanente e na
possibilidade de delegar uma representação com base na decisão assumida entre sócios
iguais e aliados. O Pacto da Sociedade das Nações continha disposições com alto grau de
generalidade, destinadas a acomodar dois tipos de interesses: os dos grandes atores e
os dos pequenos e médios Estados. Por exemplo, o Pacto previa a reunião do Conselho
quantas vezes as circunstâncias exigissem, pelo menos uma vez ao ano, na sede da
Sociedade ou em qualquer outro local que fosse designadosem especificar a forma de
designação. A possibilidade de delegar a sua representação designando um membro,
nomeado em conjunto, não se encontrava nas relações internas e não era necessária nas
relações externas, dada a posição única da Liga como organização internacional
18
e a
ausência de codificação da representação diplomática de outras entidades que não
fossem Estados.
Identificámos uma série de equivalências entre o «Memorando sobre a Organização de
um Regime de União Federal Europeia», apresentado por Aristide Briand (redigido por
Alexis Léger), em 5 de setembro de 1929, por ocasião da décima Assembleia Geral da
Sociedade das Nações e o Pacto para a Organização da Pequena Entente.
O ideal de organização federal da Europa como fator essencial da paz e a colocação da
futura federação sob a égide da Sociedade das Nações representaram o quadro ideológico
e de ação tanto para a Pequena Entente, como para a organização federal delineada
18
A União Internacional de Telecomunicações, originalmente chamada de União Internacional de Telégrafos,
fundada em 1865, é a primeira organização internacional. Fundada por tratado, a UIT tinha um secretariado
permanente e membros em todo o mundo.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 322-340
Um modelo de cooperação avant la lettre para uma Europa unida. As premissas e a evolução
da pequena entente
Mircea Iliescu
335
pelas propostas de Briand. Além disso, ambos os projetos garantiam o equilíbrio entre o
caráter soberano dos Estados-Membros e a participação no âmbito federal.
Os órgãos necessários para o funcionamento da União Federal Europeia, segundo Briand,
eram a Conferência Europeia, o Comité Político Permanente e um Secretariado.
A Conferência Europeia constituía o órgão supremo, composto por representantes de
todos os governos dos países europeus, membros da Sociedade das Nações. Este órgão
reuniria em sessões ordinárias e extraordinárias, sendo presidido, rotativamente, pelos
Estados-Membros. A Conferência era um fórum de debate político, de evidente carácter
generalista, mas ainda sem capacidades de integração da ação política. Como mostrámos
anteriormente, a condição sine qua non da tomada de decisão, na Pequena Entente,
estava relacionada com a necessidade de abordagens consensuais.
O Conselho Permanente da Pequena Entente e o Comité Político Permanente da União
Federal Europeia representavam os órgãos executivos dessas organizações. A
presidência devia ser exercida, em ambos os casos, por rotação. Entre as duas estruturas
havia uma grande diferença no plano de ação. Enquanto o Conselho Permanente da
Pequena Entente estava apetrechado para exercer a sua atividade segundo os princípios
da rotatividade, igualdade e representação, para implementar as políticas estabelecidas
pelos três aliados e funcionava como órgão executivo, o ComiPolítico Permanente
da União Federal Europeia assegurava, pelo menos em primeira instância, uma
plataforma deliberativa para a constituição da futura União Federal e o programa de
cooperação, sendo desprovida de capacidade executiva. Os serviços de secretariado das
duas organizações operavam com base em princípios relativamente semelhantes.
A estrutura e o campo de atuação da Pequena Entente resultavam da experiência direta
do aprofundamento gradual da cooperação entre os participantes, e o Pacto Organizador
transpunha, juridicamente, a possibilidade de ampliar essa cooperação na esfera
económica e em outros donios. As propostas de Briand partiam da premissa oposta,
de subordinar o económico ao político, sendo mantidas num registo mais geral. Assim, a
Conferência Europeia devia debater uma gama muito ampla de questões como: cartéis
industriais, problemas trabalhistas, créditos para as regiões menos desenvolvidas,
cooperação no campo parlamentar, intelectual, social, etc.
Outras iniciativas de organização federal, a nível europeu, como o projeto Pan Europe
(1923) do conde Richard von Coudehove-Kalergi, ou, a nível regional, a Confederação
Danubiana, de Tardieu (1931), não continham previsões institucionais específicas. Por
exemplo, o movimento pan-europeu não se baseava numa estrutura organizativa
centralizada, sendo apoiado, através da revista mensal Paneuropa (1924-1938), em
comités pan-europeus estabelecidos nas capitais europeias e em congressos organizados
em diferentes capitais. O iniciador do movimento, Coudehove-Kalergi, propunha uma
série de ideias, utópicas naquela época, mas que, em parte, viriam a concretizar-se
noutra etapa da construção europeia: um convénio entre os dirigentes europeus para a
unificação dos tratados entre as nões, seguido por arbitragens vinculativos entre os
Estados, a eliminação das fronteiras internas, a criação de uma união aduaneira e de
uma moeda única, intercâmbios intereuropeus de professores, alunos e crianças. Na
ausência de um quadro institucional e decirio integrado e de mudanças que
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 322-340
Um modelo de cooperação avant la lettre para uma Europa unida. As premissas e a evolução
da pequena entente
Mircea Iliescu
336
permitissem a integração numa estrutura confederal, estas ideias poderiam ficar na
fase de projeto.
O Pacto de Organização da Pequena Entente e as reações internacionais
O Pacto de Organização da Pequena Entente gerou reações antagónicas entre os Estados
europeus, de rejeição ou apoio expcito.
Na primeira categoria, a dos adversários, posicionava-se a Alemanha, para a qual os
planos da Pequena Entente eram um obstáculo, sobretudo na sua nova organização.
Nesse contexto, a imprensa alemã, juntamente com a italiana, húngara e lgara, iniciou
uma campanha contra a aliança. Em consequência, Nicolae Petrescu-Comnen teve, em
22 de fevereiro de 1933, uma audiência no Ministério alemão dos Negócios Estrangeiros,
na qual expôs, com estritas adaptações, a posição do governo romeno. A iniciativa
diplomática visava neutralizar as reações do governo nazista e travar o desenvolvimento
da colaboração entre o revisionismo alemão e o revisionismo dos outros países (Chiper,
2000: 54).
Um mês mais tarde, ocorreu um episódio surpreendente, explicável no contexto das
preocupações de Titulescu quanto às orientações da política alemã visando o revisionismo
e à ação diplomática da Roménia e da Pequena Entente na primeira metade de 1933, em
resposta ao projeto de pacto das quatro Grandes Potências. Em 18 de março de 1933,
Nicolae Titulescu encarregou o líder do Partido Nacional Socialista, Ștefan Tătărăscu, de
transmitir uma mensagem estritamente confidencial a Hitler. Na mensagem, transmitida
por Friedrich Weber, correspondente do jornal oficial nazista lkischer Beobachter em
Bucareste, foi mostrada que a reaproximação oficial da Roménia era desejável e
necessária, o problema polaco não constituía um obstáculo nesse sentido e que, na falta
de clareza nas relações romeno-alemães, uma separação da Roménia da França não era
possível. Titulescu também propunha um encontro, não diplomático, com o novo
chanceler e aguardava a resposta, confidencialmente, em Genebra. Se para Weber a
iniciativa de Titulescu era fruto da audiência com Carlos II, ocasião em que o rei lhe deu
a entender a importância que atribuía ao estreitamento das relações com a Alemanha,
para o Ministério alemão de Negócios Estrageiros a iniciativa era uma manobra política
para neutralizar as reações alemãs à potica externa da Roménia e o merecia
demasiada importância. A análise de Berlin, segundo a qual a iniciativa era uma manobra
política estava certa. Hitler concordou com uma reunião em Munique, mas Titulescu
mostrou-se indeciso, e a reunião nunca aconteceu (Chiper, 2000: 52-54).
Do ponto de vista da Itália, as cláusulas do Pacto de Organização da Pequena Entente,
que teriam limitado a atuação dos três Estados no cenário internacional, ofereciam «a
aparência de maior coesão do bloco». As diferenças entre os três «persistiam
naturalmente» e «provavelmente por motivos económicos a ineficiência do grupo será
demonstrada». Por outro lado, alertava o ministro italiano em Bucareste, em questões
políticas como o desarmamento, a igualdade de direitos ou a revisão de tratados, a
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 322-340
Um modelo de cooperação avant la lettre para uma Europa unida. As premissas e a evolução
da pequena entente
Mircea Iliescu
337
capacidade de coesão do grupoo devia ser subestimada, «mas devemos considerá-la
como hostil às orientações da nossa política internacional»
19
.
Da Budapeste, Vasile Grigorcea, ministro plenipotenciário da Roménia, informava em 23
de fevereiro de 1933 que a imprensa húngara dirigia uma campanha «violenta» contra a
Pequena Entente, considerada «um perigo iminente para a paz da Europa», sendo a
transformação dessa aliança considerada, nos círculos do Ministério das Negócios
Estrageiros, «o enterro definitivo dos planos franceses para a realização de uma
Confederação económica do Danúbi
20
.
A França foi naturalmente incluída no grupo de Estados favoráveis à Pequena Entente na
sua nova forma de organização. O jornal Le Temps mostrou que «A Pequena Entente
caminha para uma ampla política de solidariedade europeia. Ela es a caminhar
rapidamente para uma organização económica e aduaneira dos Estados da Europa
Central e através desta atividade serve à paz geral, que poderá constituir o ponto de
vista de uma União Europeia, da forma como Briand tinha projetad(Ciorănescu, 1996:
136). Leon Noël, o ministro francês em Praga, mostrou que o Pacto de Organização da
Pequena Entente deu origem a «comentários contraditórios e às vezes excessivos, num
sentido ou outro». Resta saber, enfatizava o diplomata francês, até que ponto os líderes
da Pequena Entente poderão tirar «as conclusões mais amplas e positivas, por exemplo,
reconhecer de jure o governo soviético em troca de certas garantias e sob certas
condições»? Segundo Noël, «A Pequena Entente não se transforma ipso facto numa
verdadeira Staatenbund», e o Pacto «aparece como um desenvolvimento lógico,
facilitado pelas circunstâncias, da política traçada desde o início, mas sobretudo depois
de 1930, pela Pequena Entente. Fortalece sérias possibilidades de desenvolvimento; o
futuro dise os estadistas conseguirão aproveitar os vindouros acontecimentos para
valorizar tudo o que o pacto contém no seu núcleo»
21
.
A legação em Varsóvia informava que a criação da Pequena Entente havia, na primeira
fase, causado «um mouvement dʼhumeur», mas os polacos começavam a olhar com mais
confiança para a situação originada pelo novo pacto que, embora não oferecesse
«qualquer satisfaçã do ponto de vista do «amor próprio» da Polónia era, no entanto,
considerado «uma garantia adicional na questão do revisionismo»
22
. Em 26 de fevereiro
de 1933, a Pequena Entente, na sua nova organização, foi acolhida pela Grécia, que se
declarou disposta a participar ao lado da Pequena Entente no caso de um conflito que
envolvesse também a Bulgária.
Num discurso proferido no Parlamento romeno em 16 de março de 1933, um mês após
a assinatura do Pacto da Pequena Entente, Nicolae Titulescu declarava: «A situação
internacional é uma das mais preocupantes. Acontecimentos recentes provam isso
19
Ministero Degli Affari Esteri e Della Cooperazione Internazionale, I Documenti Diplomatici Italiani (a seguir
D.D.I.), sétima rie 1922-1935, 1
de janeiro ‒ 15 de julho 1933, vol. XIII, Roma, Istituto Poligrafico dello
Stato, 1989, p. 105 (Doc. 101, Ministro em Bucareste, Sola, para Mussolini).
20
AMAER., Fundo Pequena Entente, ano 1933, vol. 10, p. 39.
21
D.D.F., 1932-1939, 1.ª
série (1932-1935), vol. II, 15 de novembro de 1932-17 de março 1933, Paris,
Imprimerie Nationale, 1966, pp. 679-682 (Doc. 334, Léon Noël, ministro da França em Praga, para Paul-
Boncour, ministro dos Negócios Estrangeiros, 22 de fevereiro de 1933).
22
AMAER., Fundo Pequena Entente, ano 1933, vol. 10, p. 42.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 322-340
Um modelo de cooperação avant la lettre para uma Europa unida. As premissas e a evolução
da pequena entente
Mircea Iliescu
338
amplamente. Novos acontecimentos o ainda possíveis e podem ser uma surpresa
para quem não acompanhou de perto e não conhece a evolução da política externa e
interna dos rios Estados europeus [...] Quando a paz é ameaçada, o se deve
responder com a guerra, mas sim com a organização da paz. Essa é a gênese simples e
completa do Pacto de Organização da Pequena Entente» (Titulescu, 1994: 477).
A evolução da Pequena Entente desde a sua constituição, o conteúdo e a visão sobre o
desenvolvimento europeu conferidos à organização pela assinatura do Pacto de
Organização contradizem a narrativa reducionista, a propagada de vários autores como
Magda Ádám, que considera que a Pequena Entente não deve ser considerada «um bloco
regional com caráter operacional perante os Estados fascistas», e que o Pacto de
Organização não produziu grandes mudanças em termos de natureza da organização ou
militar e política em relação aos tratados iniciais da década dos ’20 (Ádám, 1975: 7-8).
O Pacto de Organização representou um verdadeiro tratado de recolocação da Pequena
Entente em novas bases, como estrutura federativa regional sui generis, ato notável pela
sua brevidade e clareza, mas sobretudo devido às suas formas singulares de organização
e tomada de decisões.
A assinatura do Pacto de Organização foi possível graças à visão e vontade política
demonstradas por Nicolae Titulescu e os seus homólogos jugoslavo e checoslovaco. O
pacto resultou, porém, de um processo cumulativo de amadurecimento não ao nível
político, mas também nas camadas sociais mais profundas dos três países norteado
pela igualdade, soberania e integridade territorial, à luz dos «14 pontos wilsonianos» e
das disposições dos Tratados de Paz de Paris.
Conclusões
Num contexto europeu e internacional tenso, a reconfiguração da Pequena Entente na
década dos ’30, enquanto organização regional com poderes federativos constituiu uma
mudança de paradigma, uma exceção à regra dos tratados clássicos e um marco para o
desenvolvimento de fórmulas de cooperação em maior escala.
O núcleo de princípios, valores e a arquitetura institucional da Pequena Entente, a sua
filosofia de integrar a cooperação por etapas, passando da união económica para a união
política, que, claro, incluía também a dimensão da prevenção de conflitos, representa um
possível modelo precursor para o avanço do projeto europeu após a Segunda Guerra
Mundial, que culminou, na década dos ’50, com a criação das Comunidades Europeias.
Através de abordagens construtivas e equilibradas, que evitavam as tentações de
assumir modelos utópicos ou de se fechar num rígido realismo, a Roménia tem
consolidado, durante quase duas décadas, uma voz distinta na reflexão sobre o
desenvolvimento da ideia europeia.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 322-340
Um modelo de cooperação avant la lettre para uma Europa unida. As premissas e a evolução
da pequena entente
Mircea Iliescu
339
Referências
Ádám, Magda (1975). ”Les pays danubiens et Hitler (1933-1936), în Revue d’histoire de
la Deuxième Guerre Mondiale, vol. 25, n98. Paris: Presses Universitaires de France.
Brighi, Elisabeta (2013). Foreign Policy, Domestic Politics and International Relations.
The case of Italy, Oxon-Nova Iorque: Routledge.
Campus, Eliza (1997). Mica Înțelegere. Bucareste: Editura Academiei Române.
Carmi, Ozer (1972). La Grande-Bretagne et la Petite Entente. Genebra: Librairie Droz.
Chiper, Ioan (2000). Romania și Germania nazistă. Bucareste: Editura ELION.
Ciorănescu, George (1996). Românii și ideea federalistă. Bucareste: Editura
Enciclopedică.
Constantiniu, Florin (2010). O istorie sinceră a poporului român. Bucareste: Editura
Univers Enciclopedic GOLD.
Gerbert, Pierre (2012). ”Les organisations internationales”, în Frank Robert (dir.), Pour
l’histoire des relations internationales, Paris: Presses Universitaires de France.
Hobsbawm, Eric (1994). The Age of Extremes: The Short Twentieth Century, 19141991.
Londres: Penguin Book.
https://european-union.europa.eu/institutions-law-budget/institutions-and-
bodies/types-institutions-and-bodies_en
https://www.itu.int/en/Pages/default.aspx.
Kennedy, David W. (1987). ”The Move to Institutions”, în Cardozo Law Review, vol. 8,
n.º 5. Recuperado de http://nrs.harvard.edu/urn-3:HUL.InstRepos:16136131.
Mićić, Srđan (2020). ”The Influence of France and Italy’s (Central) European projects on
Yugoslavia’s re-evaluation of regional Pacts (1927–1933)”, în Istorija 20. Veka, vol. 38,
n.º 2. Recuperado de https://doi.org/10.29362/ist20veka.2020.2.mic.39-60.
Nanu, Frederic C. (1993). Politica exter a României 1918-1933. Iași: Institutul
European.
Rémond, René (2002). Introduction à l'histoire de notre temps, t. 3. Le XXe siècle de
1914 à nos jours. Paris: Éditions du Seuil.
Scurtu, Ioan (coord.). 2003. Istoria Românilor, vol. VIII, Ronia întregi. Bucareste:
Editura Enciclopedică.
Titulescu, Nicolae (1967). Documente diplomatice (ed. G. Macovei). Bucareste: Editura
Politică.
Titulescu, Nicolae (1994). Politica externă a României (1937). Bucareste: Editura
Enciclopedică.
Steiner, Zara (2005). The Lights that Failed. European International History, 1919-1933.
Oxford: Oxford University Press.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 14, Nº. 2 (Novembro 2023-Abril 2024), pp. 322-340
Um modelo de cooperação avant la lettre para uma Europa unida. As premissas e a evolução
da pequena entente
Mircea Iliescu
340
Vanku, Milan (1979). Mica Îelegere și politica externă a Iugoslaviei, 1920-1938.
Bucareste: Editura Politică.
Vanku, Milan (1986). Nicolae Titulescu, promotor al politicii de pace și colaborare în
Balcani. Bucareste: Editura Politică.