OBSERVARE
Universidade Autónoma de Lisboa
e-ISSN: 1647-7251
VOL. 16, Nº. 2
novembro 2025-abril 2026
329
A PROJEÇÃO INTERNACIONAL DE ANGOLA: CONDICIONANTES INTERNOS DA
POLÍTICA EXTERNA E DA POLÍTICA DE DEFESA
NATHALY XAVIER SCHUTZ
nathalyschutz@unipampa.edu.br
Doutora em Ciência Política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professora
Associada de Relações Internacionais na Universidade Federal do Pampa, Unipampa (Brasil).
Professora do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais da Universidade Federal
de Santa Maria (UFSM) Brasil.
Resumo
Angola é um Estado de grande relevância na África Austral e Central. Após o acordo de paz,
em 2002, entre as forças do governo, o Movimento Popular para a Libertação de Angola
(MPLA), e da oposição, a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA),
emerge como uma importante liderança africana. A compreensão da sua política externa e
sua política de defesa implicam, primeiramente, entender a influência que os fatores
domésticos, em especial a permanência do MPLA no governo, tem na formulação dessas
políticas e nos objetivos impostos. O objetivo do presente artigo é analisar essa relação,
utilizando o fim da guerra civil, em 2002, e a saída do poder de Dos Santos, em 2017, como
momentos de mudança política interna decisivos. Espera-se demonstrar como a inserção
internacional de Angola está pautada, em grande medida, por interesses internos,
principalmente o desejo do MPLA de manter-se no poder.
Palavras-chave
África, Angola, política de defesa, política externa, potência regional.
Abstract
Angola is a highly influential country in Southern and Central Africa. Following the 2002 peace
agreement between government forces, the Popular Movement for the Liberation of Angola
(MPLA), and the opposition, the National Union for the Total Independence of Angola (UNITA),
it has emerged as an important African leader. Understanding its foreign and defence policies
requires, first and foremost, an understanding of the influence that domestic factors,
particularly the MPLA's continued hold on power, have on the formulation of these policies
and the objectives set. The aim of this article is to analyse this relationship, using the end of
the civil war in 2002 and Dos Santos' departure from power in 2017 as decisive moments of
internal political change. It is hoped to demonstrate how Angola's international integration is
largely guided by internal interests, particularly the MPLA's desire to remain in power.
Keywords
Africa, Angola, defense policy, foreign policy, regional power.
Como citar este artigo
Schutz, Nathaly Xavier (2025). A Projeção Internacional de Angola: Condicionantes Internos da
Política Externa e da Política de Defesa. Janus.net, e-journal of international relations. VOL. 16,
Nº. 2, novembro 2025-abril 2026, pp. 329-345. DOI https://doi.org/10.26619/1647-7251.16.2.18
Artigo submetido em 16 de maio de 2025 e aceite para publicação em 4 de setembro de
2025.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
VOL. 16, Nº. 2
Novembro 2025-abril 2026, pp. 329-345
A Projeção Internacional de Angola: Condicionantes Internos da Política Externa
e da Política de Defesa
Nathaly Xavier Schutz
330
A PROJEÇÃO INTERNACIONAL DE ANGOLA: CONDICIONANTES
INTERNOS DA POLÍTICA EXTERNA E DA POLÍTICA DE DEFESA
1
NATHALY XAVIER SCHUTZ
Considerações iniciais
Angola surge, a partir de 2002, com o encerramento do conflito em seu território, como
uma importante liderança africana. Ao contrário da África do Sul, que é reconhecida fora
da África como um polo de poder, mas enfrenta resistência entre os vizinhos, Angola
goza de uma significativa legitimidade entre os africanos, o que a coloca em uma posição
singular, especialmente na África Austral e Central. Seu posicionamento geopolítico, na
conexão entre essas duas regiões do Continente, também a credencia como Estado de
suma importância para as relações intra-africanas.
O Estado tem um histórico de ingerência externa e conflito que, ainda hoje, impacta na
sua construção. Ao longo do processo de colonização da África pelos Estados europeus,
que se inicia com o estabelecimento de entrepostos litorâneos ainda no século XV e
culmina com a ocupação efetiva de quase todo o Continente
2
no final do século XIX, o
território angolano foi controlado por Portugal. A luta pela independência, que é
conquistada em 1975, durou quase 15 anos, e imediatamente após, tem início a guerra
civil entre as forças do governo, o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA),
e a oposição, a União para a Independência Total de Angola (UNITA), que se encerrará
apenas em 2002.
Mesmo que, desde 2008, tenham acontecido eleições periódicas e que estas tenham sido
reconhecidas pelas missões de observação eleitoral de várias organizações
internacionais, ainda que questionadas pela oposição, a permanência no poder do MPLA,
sem dúvida, é um aspecto a ser considerado. A ausência de alternância no poder é uma
problemática comum a vários países africanos. Existe o multipartidarismo e eleições
periódicas, mas o mesmo partido mantem-se no poder. Partido esse, que, na maioria
das vezes, tem sua origem em um movimento de libertação, como no caso de Angola.
Essa permanência de uma mesma elite política no poder desde a independência se
materializa em uma ausência de separação clara entre partido, governo e Estado. E isso
se reflete na formulação das políticas públicas, inclusive a política externa e a de defesa.
Além disso, como destaca Clapham (2012) o fato de os partidos serem criados a partir
1
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.
2
É importante lembrar que a Etiópia logrou resistir independente.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
VOL. 16, Nº. 2
Novembro 2025-abril 2026, pp. 329-345
A Projeção Internacional de Angola: Condicionantes Internos da Política Externa
e da Política de Defesa
Nathaly Xavier Schutz
331
de movimentos de libertação leva a uma subordinação das forças de repressão ao partido
e não ao Estado.
Na verdade, em muitos dos casos, esse controle do aparato coercivo é ainda mais
anterior, no próprio processo de colonização. Aeby (2019) argumenta que alguns dos
partidos no poder em África assumem as estruturas de coerção deixadas pelo colonizador
e as utilizam para se manter no poder, através da perseguição de grupos de oposição e
restrição das liberdades.
Somado a isso, tem-se a problemática da construção de um sistema livre e em igualdades
de condição antes, durante e depois do pleito. Quando não há essa clara separação entre
partido e Estado, a oposição tende a ficar em desvantagem, já que, como lembra
Thompson (2010), tanto a própria fraqueza das instituições quanto as mencionadas
práticas deliberadas adotadas pelo partido que está no poder tornam o ambiente
assimétrico em condições de competição.
Essa falta de alternância no poder, para além de um problema democrático, também é
reflexo de um problema partidário-institucional. Os partidos em Angola, e em África de
um modo geral, tem a característica de estarem centrados em figuras emblemáticas e
possuírem bases ideológicas frágeis ou pouco conectadas com as realidades atuais dos
Estados (Schutz, 2024). Isso, ao mesmo tempo em que facilita a manutenção do partido
que está no poder, também enfraquece a oposição, que não a identificação da
população com os partidos e, portanto, não há mobilização para a mudança no poder.
Tanto a política externa quanto a política de defesa angolanas refletem as
particularidades do seu contexto interno, ao mesmo tempo em que tentam responder às
demandas do sistema internacional e aos anseios de ocupar um papel de maior destaque
na África. Esta pesquisa, assim, tem como problema norteador compreender a relação
existente entre as variáveis domésticas, em específico a manutenção do poder do MPLA,
e a construção das políticas externa e de defesa, bem como a articulação existente entre
elas.
Ancora-se nas perspectivas de análise de política externa que defendem o
condicionamento da formulação dessas políticas não aos objetivos do Estado, mas
também aos fatores históricos e os aspectos domésticos. Hill (2003) irá afirmar que a
estrutura constitucional e a distribuição e equilíbrio entre os poderes (executivo,
legislativo e judiciário) do Estado irão influenciar diretamente na concepção da política
externa.
Ainda sobre os as questões internas, tem-se o que se pode chamar de grandes mudanças
ou rupturas, como processos revolucionários, guerras civis ou golpes de Estado (Halliday,
1999). Essas mudanças teriam um peso ainda maior, impactando não só na formulação
da política externa, mas na viabilidade da sua implementação. Soma-se a esses aspectos,
a própria disponibilidade de recursos do Estado (Bembe, 2016).
Parte-se do pressuposto de que a presença do MPLA no governo de Angola, desde a
independência, criou uma ausência de clara separação entre interesses do partido e do
Estado, e que isso também se reflete nas políticas externa e de defesa. Além disso, o
histórico do partido, originário de um movimento de libertação imprime características
específicas a essa elite política, entre outras coisas, uma grande participação dos
militares em várias esferas políticas e decisórias.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
VOL. 16, Nº. 2
Novembro 2025-abril 2026, pp. 329-345
A Projeção Internacional de Angola: Condicionantes Internos da Política Externa
e da Política de Defesa
Nathaly Xavier Schutz
332
A metodologia adotada é qualitativa com abordagem histórica-comparativa, empregando
a técnica de comparação de um mesmo caso em períodos temporais distintos. A pesquisa
tem caráter descritivo e explicativo. Será aplicada a análise de fontes bibliográficas
primárias e referências secundárias já trabalhadas sobre o tema.
A primeira parte do artigo será dedicada a compreender a estabilização do país após o
encerramento da guerra civil em 2002, em especial os processos eleitorais e as mudanças
nas forças políticas de oposição. Em um segundo momento, será analisada a saída de
José Eduardo dos Santos do poder para dar lugar a João Lourenço e as eventuais
mudanças que decorreram dessa troca de liderança. Por fim, a última seção será
dedicada a compreender a evolução das políticas externa e de defesa de Angola nas
últimas duas décadas, com o intuito de compreender como essas alterações internas
interferiram na projeção internacional do país e os desafios teóricos dessa análise.
Pacificação e reordenamento
Angola inicia uma nova fase no seu processo de consolidação estatal a partir de 2002,
quando tem fim o conflito interno entre as forças que estavam no poder (MPLA) e a
UNITA. O Memorandum de Entendimento de Luena Complementar ao Protocolo de
Lusaka pôs fim aos quase trinta anos de guerra civil em território angolano e inaugura
um período de paz nunca antes experimentado pelo país desde que o início do processo
de colonização.
A partir desse momento, a expectativa de que o país avance no caminho da
democratização, com multipartidarismo, eleições periódicas e fortalecimento das
instituições. É forçoso lembrar que, em 1991, o Acordo de Bicesse, que estabeleceram o
cessar-fogo entre MPLA e UNITA, também determinaram a realização de eleições
multipartidárias, que ocorrem em 1992. O resultado, contudo, não é reconhecido pela
oposição, ainda que a Missão de Observação Eleitoral das Nações Unidas tenha atestado
pleito como legítimo, e a guerra civil é retomada.
Os primeiros anos pós-Luena seguem conturbados e as primeiras eleições
3
, para o poder
legislativo, vão ocorrer apenas em 2008. O MPLA conquista mais de 80% das cadeiras,
refletindo a influência ainda exercida do Partido sobre as instituições. Como lembra Vidal
(2024), o longo período entre o fim do conflito e a realização das eleições permitiu ao
MPLA organizar e controlar grande parte das forças e processos preparatórios, incluindo
a legislação eleitoral e o recenseamento.
Outro marco importante é, em 2010, a promulgação de uma nova Constituição, que
institui a eleição indireta para o Chefe do Executivo; o Presidente, assim, passa a ser
indicado pelo Parlamento. Importante destacar que a Constituição é aprovada por quase
unanimidade, após a UNITA recusar-se a participar da votação.
É no bojo dessa nova legislação que ocorre um novo pleito em 2012. Mais uma vez, o
MPLA sai vitorioso, e José Eduardo dos Santos se mantém na Presidência. É importante
registrar que se teve a participação de um novo partido de oposição, a Convergência
3
Consoante o Acordo de Paz firmado em 2002, as eleições deveriam ocorrer em 2004.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
VOL. 16, Nº. 2
Novembro 2025-abril 2026, pp. 329-345
A Projeção Internacional de Angola: Condicionantes Internos da Política Externa
e da Política de Defesa
Nathaly Xavier Schutz
333
Ampla para Salvação de Angola Coligação Eleitoral (CASA-CE), formada a partir de
dissidências da UNITA.
A manutenção da periodicidade das eleições, ainda que não seja garantia de democracia,
é uma sinalização importante. Na visão de Solar-Crespo (2019), existem três fatores a
serão determinantes no processo de democratização dos países africanos. O primeiro diz
respeito ao acordo político estabelecido quando o grupo dominante sobe ao poder;
importa, nesse caso, se há ingerência de atores externos e se há mobilização efetiva da
sociedade civil. O segundo aspecto refere-se ao nível de predominância do movimento
de libertação vitorioso em relação aos demais. Por fim, é importante que haja uma clara
separação de poderes e o estabelecimento de limites constitucionais ao poder do Chefe
do Executivo.
O contexto angolano, nessa perspectiva, é bastante preocupante. Para além das
alterações da Constituição, que, entre outras coisas, extinguiu a eleição direta para
Presidente, a relação bastante desigual entre MPLA e UNITA seja no imediato
pacificação, seja nas disputas eleitorais posteriores pode ser um fator de
desestabilização e de dificuldade de avanço democrático.
O fim da Era “Dos Santos
Como previsto na legislação, em 2017 são realizadas eleições parlamentares. O pleito é
de grande relevância para a história angolana. Isso porque, depois de quase 40 anos no
poder, JoEduardo dos Santos deixa de ser o candidato do MPLA. No seu lugar, assume
João Lourenço, antigo Ministro da Defesa e antigo Vice-Presidente do Partido. A mudança
de candidato, que havia sido anunciada no ano anterior, trouxe, tanto para a população
como um todo, quanto para os partidos de oposição, a visualização de uma real
possibilidade de mudança. Na visão de Matsimbe e Domingos (2018), o pleito foi marcado
por uma campanha mais acirrada da oposição e uma participação mais ativa da sociedade
civil.
A vitória do MPLA o foi o expressiva quanto nas eleições anteriores, ficando com
menos de 75% das cadeiras, o que, nominalmente, representou 25 a menos que na
eleição anterior (Morris, 2017). A subida ao poder de um novo governante, ainda que do
mesmo Partido, gerou uma significativa expectativa de mudança para o povo angolano,
assim como para a comunidade internacional.
Não se pode olvidar, contudo, que a saída de Dos Santos da Presidência não significou
sua retirada da cena política angolana. Dos Santos continuou ocupando a presidência do
Partido por mais um ano
4
e, antes de deixar a chefia do Executivo, garantiu, com
mudanças nos períodos de mandato de cargos, que seus aliados se mantivessem no
governo em posições estratégicas, em especial nas forças de segurança (Almeida e
Satula, 2018).
Além disso, como destacam Herbst e Mills (2018), não necessariamente a troca da figura
do governante significa alguma mudança efetiva. Para que ela ocorra, é preciso que
outros atores políticos e burocráticos também sejam modificados, o que, como será visto,
4
Foi a primeira vez que a presidência do MPLA não foi ocupada pelo Presidente do país.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
VOL. 16, Nº. 2
Novembro 2025-abril 2026, pp. 329-345
A Projeção Internacional de Angola: Condicionantes Internos da Política Externa
e da Política de Defesa
Nathaly Xavier Schutz
334
não foi o caso de Angola. A mudança do Presidente, assim, sem a mudança do Partido,
tem poucas chances de resultar em transformações expressivas.
Lourenço inicia seu mandato fazendo algumas mudanças e dando sinais de que adotaria
uma nova postura no governo. Nesse sentido, são emblemáticos: a retirada da filha de
Dos Santos, Isabel dos Santos, da presidência da SONANGOL e a mudança de grande
parte dos governantes locais (Augé, 2018; Almeida, 2019).
As mudanças mais profundas, especialmente aquelas relacionadas às forças de
segurança, todavia, não acontecem. Como destacam Bye, Igles e Orre (2021), as forças
militares e de segurança são um dos principais círculos de poder ao redor do Presidente,
com uma grande influência, o na política de defesa, mas também na política externa
e em outros âmbitos domésticos. E, nesse setor, Lourenço mantém os membros
conhecidos da gestão de Dos Santos, inclusive combatentes da luta de libertação, o que
para Augé (2019), evidencia a sua ligação com as bases tradicionais do Partido.
É importante ressaltar que Lourenço também vai promover algumas alterações no
próprio Partido. A mais notória envolve a ampliação, tanto do Comitê Central quanto do
Bureau Político, com a nomeação de novos membros. Para Vines (2021), isso reflete a
intenção de Lourenço de exercer maior controle do MPLA, reduzindo a proporção de
pessoas ligadas diretamente ao Dos Santos.
Em 2022, temos novas eleições e, mais uma vez, uma vitória do MPLA, mantendo
Lourenço na Presidência. O desempenho do MPLA, todavia, foi o pior desde que se
iniciaram as eleições periódicas, garantindo apenas 51% dos votos e 124 cadeiras no
Parlamento. Destaque-se que a eleição acontece em um cenário bastante turbulento,
marcado pela morte recente de José Eduardo dos Santos
5
(Schutz, 2024).
O segundo mandato de Lourenço começa sem grandes expectativas de mudança. A
população angolana demonstra desgaste e descontentamento depois de rios anos de
recessão econômica, somados a crise internacional gerada pela pandemia de COVID-19
em 2020. Além disso, as medidas anticorrupção, que tinham sido a grande simbologia
de renovação do primeiro governo de Lourenço, seguiam concentradas apenas na família
Dos Santos, sem avançar para os setores militares, o que era o anseio de grande parte
dos angolanos (Schutz, 2024).
Reinserção angolana
A compreensão da inserção angolana no sistema internacional passa por um
entendimento prévio de como os Estados africanos enfrentam os desafios de se
consolidarem, ao mesmo tempo que almejam se projetar internacionalmente. As teorias
tradicionais de relações internacionais, em especial as da vertente realista, concentram
a sua atenção nas ameaças externas do Estado. Os Estados africanos, contudo, estão
inseridos em um contexto distinto e muito mais complexo, no qual, grande parte das
ameaças tem suas origens dentro das fronteiras nacionais.
5
É igualmente emblemático que UNITA tenha conquistado 44% dos assentos, seu melhor resultado em um
pleito e, em Luanda, ter garantido 63% dos votos, quase o dobro do MPLA que, na capital, fez apenas 33%
dos votos.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
VOL. 16, Nº. 2
Novembro 2025-abril 2026, pp. 329-345
A Projeção Internacional de Angola: Condicionantes Internos da Política Externa
e da Política de Defesa
Nathaly Xavier Schutz
335
É o que alguns autores irão denominar de dilema de segurança interno
6
. A preocupação
central do Estado não está no vizinho ou no temor de algum ataque externo, mas sim
nas dificuldades de consolidar a soberania doméstica e conter forças insurgentes ou que
ameacem a estabilidade internamente. Ayoob (2002), em sua análise que ficou conhecida
como realismo subalterno, irá defender que, no caso dos Estados periféricos, as
estruturas internas e externas estão intimamente interrelacionadas, e que as ingerências
externas terão interferência nesse processo de construção do Estado.
Nos Estados africanos como um todo, mas, mais especificamente no caso angolano, o
processo de colonização, evidentemente, tem um grande peso nessas dificuldades de
consolidação estatal e, por consequente, projeção internacional. Para além da própria
ocupação do território, tem-se os conflitos originários desses processos, tanto de
independência quanto a posterior guerra civil, marcados por forte interferência de outros
Estados além de Portugal, notadamente Estados Unidos da América, União
Soviética/Rússia, China e África do Sul.
A própria ideia de que o Estado é a única fonte possível de garantir os seus interesses,
ou seja, a ideia de que apenas o grupo político que está no poder gozará os seus direitos,
é uma fonte de instabilidade e conflito (Ngubane, 2004). Uma parcela significativa dos
países africanos, a exemplo do que acontece em Angola, tem um mesmo partido no
poder desde a independência, o que, como já foi visto, não só é um problema do ponto
de vista da construção da democracia, mas também uma fonte de instabilidade e conflito
doméstico.
Mais especificamente quando se trata da análise da política externa, o que também pode
ser ampliado para a política de defesa, deve-se ter em mente as dinâmicas específicas
que envolvem o processo decisório e de formulação de políticas. A dificuldade de
separação entre Estado e governo, ou Estado e partido, mencionada anteriormente,
também traz à tona a peculiaridade das figuras políticas de destaque, os big men ou
warlords (Dunn, 2001; Reno, 2001). A própria fragilidade das instituições e da
democracia, gera uma centralização do governo em torno de um líder e não do Estado
(Matlosa, 2010).
Essas lideranças políticas, no caso de Angola, em especial José Eduardo dos Santos,
utilizam das instituições e políticas estatais para garantir a sua manutenção no poder.
Nesses casos, a própria fragilidade do Estado, contrastando com a sua soberania externa
formalmente reconhecida, é percebida como um ativo valioso. A permanência no poder,
assim, é vendida como uma necessidade e a existência de conflitos e instabilidades
justificam essa figura forte de liderança.
Sob outra perspectiva, trata-se de garantir a segurança do regime, e não a segurança
do Estado (Clark, 2001). Quem governa, assim, age preocupado com as possíveis
ameaças ao seu poder o que, não necessariamente, seria uma ameaça ao Estado. Deriva
daí, por exemplo, a tolerância e o favorecimento a grupos internos que, em muitos dos
6
Em uma alusão ao termo “dilema de segurança”, conceito central das abordagens realistas de relações
internacionais e que faz referência ao fato de que, quanto mais um Estado amplia seus recursos militares
para se sentir seguro, mais inseguro o sistema fica, tendo em vista que os demais Estados, sentindo-se
ameaçados e sem saber as intenções do outro, irão reagir, também ampliando suas forças e criando uma
escalada de violência.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
VOL. 16, Nº. 2
Novembro 2025-abril 2026, pp. 329-345
A Projeção Internacional de Angola: Condicionantes Internos da Política Externa
e da Política de Defesa
Nathaly Xavier Schutz
336
casos, significa a manutenção de estruturas de poder oriundas do próprio processo de
colonização.
É o caso de Angola e da relação de Lourenço com as elites militares do MPLA. Como
enfatiza Clark (2001:95):
[…] o que o governante africano típico precisa com mais urgência para
garantir seu regime no poder? Mais importante ainda, ele precisa da boa
vontade ou tolerância daqueles que estão em posição de ameaçar
diretamente o controle de seu regime sobre o aparato estatal. [Isso] inclui
membros importantes das forças armadas nacionais, os líderes de potenciais
grupos insurgentes domésticos, os líderes de estados vizinhos (por meio de
seu potencial apoio a insurgências) e os governantes de grandes potências
no exterior.
Fica evidente, assim, porque as transformações e mudanças esperadas na condução do
governo angolano com a troca de dirigentes foram pouco expressivas. Isso não se
restringe ao campo das políticas domésticas, mas também da política externa e de
defesa.
Ao longo dos anos, a política externa angolana respondeu, em grande medida, às
necessidades do MPLA, ameaçado pela UNITA, de se manter no poder. Da mesma forma,
a política de defesa também era pensada sob uma perspectiva de ameaça doméstica.
Isso impacta diretamente na própria estruturação das Forças Armadas Angolanas, com
uma forte preponderância do Exército sobre as demais forças.
É importante lembrar, também, a própria origem das Forças Armadas Angolanas, que
residem no Exército Popular de Libertação de Angola, do MPLA. No bojo dos Acordos de
Bicesse, se previa a desmobilização e formação de forças armadas únicas (as Forças
Armadas Angolanas), num processo a ser concluído até as eleições de 1992; o o
reconhecimento do pleito de 1992 e a retomada das hostilidades comprometem o projeto
de estruturação das FAA, a raiz das suas origens, contudo, está nesse processo
(Bernardino, 2013).
A encerramento da guerra civil, em 2002, é o primeiro grande marco de mudança na
política externa angolana. Até então, a principal preocupação do governo angolano, e
que se refletia diretamente não na política externa mas também na política de defesa,
era conter as forças da UNITA. Isso traduzia-se em uma ação externa voltada para
impedir os auxílios externos da UNITA e isolar eventuais apoiadores do grupo.
A pacificação permitiu uma reestruturação das políticas pensadas por Luanda. É
importante destacar, contudo, que isso não significou que o Partido tenha abandonado a
sua prioridade, ou seja, manter-se no poder. O que se altera são os meios e estratégias
pensadas para esse fim. A inserção angolana no sistema internacional, desta forma, é
vista como um instrumento de fortalecimento e construção de legitimidade.
No imediato s-2002, grande parte dos esforços angolanos estarão concentrados na
melhoria da imagem internacional do país com dois objetivos específicos: do ponto de
vista econômico, atrair investidores externos através da garantia de um ambiente estável
e seguro para aas atividades econômicas e, assim, estimular o crescimento econômico;
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
VOL. 16, Nº. 2
Novembro 2025-abril 2026, pp. 329-345
A Projeção Internacional de Angola: Condicionantes Internos da Política Externa
e da Política de Defesa
Nathaly Xavier Schutz
337
no âmbito político, demonstrar que o país estava seguindo no caminho da democracia e
que os processos e instituições estavam sendo fortalecidos.
A política externa nesse momento, assim, tinha uma característica de normalização e
(re)construção de parcerias. Essencialmente, o objetivo era assegurar que Angola não
era mais um país em guerra e que estava evoluindo em uma transição gradual para a
paz e a democracia. Nesse sentido, Roque (2013) afirma que o governo de Dos Santos
é caracterizado pela preocupação em reconstruir a imagem do regime liderado pelo
MPLA, ao mesmo tempo em que almeja tornar-se um Estado com maior influênica
regional.
Também é um marco, a partir de 2002, a maior ênfase que se passa a dar à diplomacia
como instrumento de promoção do desenvolvimento (Ginga, 2014). É importante
lembrar que a pacificação do território, ao mesmo tempo em que significa a resolução de
um grande problema interno, também representa a necessidade de lidar com outros
desafios, notadamente, as condições socioeconômicas da população.
É evidente a conexão entre o contexto doméstico e as eventuais mudanças na política
externa; mas é igualmente importante compreender como os contextos regionais e
internacionais também foram considerados. Entre os vizinhos, a conjuntura, como
lembra Malaquias (2011), era bastante favorável, levando em conta uma África do Sul
muito mais cooperativa desde o encerramento do apartheid e a volta ao poder de Denis
Sassou Nguesso na República do Congo, além, obviamente, da queda de Mobuto, na
República Democrática do Congo.
Do ponto de vista internacional, Angola valia-se da importante e longeva parceria com a
China, que seguia bastante fortalecida. Além disso, a cooperação sul-sul estava em
franca expansão, possibilitando outras relações, como com o Brasil. Garantia-se, desta
forma, a ampliação das relações comerciais e de investimento, aproveitando uma
conjuntura internacional também favorável.
Essa relação entre o doméstico e o internacional, tão evidente quando se trata do caso
angolano, também tem reflexos na intersecção entre política externa e política de defesa.
Sobre essa questão, um aspecto em específico merece maior atenção: a participação dos
militares, ainda que da reserva, tanto na formulação quanto na execução da política
externa.
Esse papel desempenhado pelos militares em outras esferas, em parte, é um reflexo da
fragilidade das demais instituições angolanas, nesse caso, o corpo diplomático, preteridas
ao longo das décadas de conflitos, em favor das forças de segurança (Castellano, 2015).
Não se pode olvidar, todavia, que as relações entre força e diplomacia são históricas.
Aron (2002) já trazia à tona a importância desses dois instrumentos e a impossibilidade
de um Estado atuar no sistema internacional sem equilibrar esses dois aspectos,
simbolizados por ela na figura do soldado e do diplomata.
Não se trata, portanto, de excluir os militares da diplomacia; sua presença é desejada e
necessária. O que é preciso é que essa participação, de fato, esteja inserida em uma
política externa e de defesa pensadas e concatenadas para a inserção qualificada de
Angola, e não baseada nos interesses pessoais da elite militar. Ginga (2014), por
exemplo, defende o que ele chama de diplomacia securitária, com a participação ativa
das Forças Armadas Angolanas na diplomacia, como no caso das operações de paz
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
VOL. 16, Nº. 2
Novembro 2025-abril 2026, pp. 329-345
A Projeção Internacional de Angola: Condicionantes Internos da Política Externa
e da Política de Defesa
Nathaly Xavier Schutz
338
conduzidas por organizações africanas, como União Africana (UA) e Comunidade para o
Desenvolvimento da África Austral (SADC).
É também no âmbito da defesa e segurança que Angola tem demonstrado esforços de
aproximação com vizinhos, o que também está relacionado com sua intenção de
posicionar-se como um der regional. Para Almeida (2016), Angola surge como uma
importante, se não a principal, força estabilizadora na região africana centro-austral.
Uma relação, em especial, merece maior destaque: Guiné-Bissau. A presença angolana
em Guiné-Bissau, é multifatorial, já que Angola tem investimentos importantes nos país
e, auxiliou, em 2010, no processo de reforma do setor de segurança, dentro de um
esforço mais amplo de estabilização (Roque, 2013). Vale ressaltar, contudo, que esse
auxílio enfrentou problemas e a Missão de Angola na Guiné-Bissau (MISSANG) encerrou-
se depois de um ano.
7
Para alguns autores, essa relação demonstra tanto os desafios que Angola enfrenta na
região, quanto a postura de liderança que deseja demonstrar. De acordo com Roque
(2013:7), a experiência possibilitou que Luanda entendesse “a importância de angariar
apoio regional e multilateral, o que poderia, como resultado, levar a um papel mais
responsivo e ativo no fortalecimento da arquitetura de segurança do continente”.
Ainda no tocante à região, é forçoso mencionar a relação Angola África do Sul. Após o
fim do apartheid na África do Sul, em 1994, os dois Estados mantém relações bastante
próximas, ainda que com algumas oscilações, com um relativo distanciamento durante a
gestão Mbeki. Ainda assim, temos o estreitamento importante da cooperação em defesa,
com a assinatura de um acordo em 2012 (Roque, 2013).
O lócus mais evidente onde é possível vislumbrar não a possibilidade, mas a
necessidade de conexão entre as políticas externa e de defesa de Angola e que, por sua
vez, é também um imperativo para a sua projeção internacional é a estratégia marítima.
O Atlântico Sul, desta forma, apresenta-se como um promissor ambiente estratégico
para Luanda.
A importância do mar para Angola é incontestável. Passa pelos aspectos econômicos,
com a concentração dos recursos energéticos no mar e região litorânea (Pegado, 2014),
até as questões securitárias, com a defesa do território e garantia da segurança das rotas
marítimas. Vale lembrar que Angola possui cinco portos no Atlântico e que são
importantes alternativas aos portos da África do Sul (Scholvin, 2017). O fortalecimento
da política marítima, portanto, também é um instrumento de projeção regional.
Quanto a isso, dois aspectos destacam-se: primeiro é a preferência angolana em atuar
em organizações multilaterais em detrimento de acordos bilaterais, dando grande peso
para a Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul (ZOPACAS
8
) e a Comissão do Golfo da
7
A MISSANG se estabeleceu em março de 2011 através de acordo bilateral entre os dois governos. A presença
das Forças Armadas Angolanas no território guineense, contudo, foi conturbado, com os militares angolanos
acusados de colaborarem com a liderança política que havia sido destituída e de não entregarem às forças
guineenses o material bélico previsto no acordo.
8
A Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul foi criada em 27 de outubro de 1986. À época de sua criação, a
ZOPACAS refletia, em parte, o temor dos países da região de que as tensões da Guerra Fria acabassem
impactando na região de maneira mais acentuada. Atualmente, fazem parte Brasil, Argentina, Uruguai, Angola,
Benin, Camarões, Cabo Verde, República do Congo, Costa do Marfim, República Democrática do Congo, Guiné
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
VOL. 16, Nº. 2
Novembro 2025-abril 2026, pp. 329-345
A Projeção Internacional de Angola: Condicionantes Internos da Política Externa
e da Política de Defesa
Nathaly Xavier Schutz
339
Guiné (CGG
9
). Angola esteve na liderança da revitalização da ZOPACAS, em 2007,
promovendo a sua VI Reunião Ministerial em Luanda.
Da mesma forma, Luanda sedia a CGG e reconhece a importância que o Golfo da Guiné
tem, não para Angola, mas para toda a segurança da África. A Comissão, ainda que
com uma estrutura institucional insipiente, é um importante ambiente de relação entre
os Estados da região que, por sua vez, são percebidos por Angola como parceiros
importantes. Além disso, através da CGG, Angola coloca-se como uma alternativa à
liderança nigeriana na região (Almeida; Bernardino, 2013).
O segundo aspecto a ser considerado é a fragilidade da política naval angolana como um
todo e, em específico, a debilidade da Marinha de Guerra Angolana (MGA).
Historicamente, em função dos próprios conflitos internos, o foco das Forças Armadas
Angolanas estava nas forças terrestres. Com a pacificação, em 2002, inicia-se uma
tentativa de reestruturação e modernização que, em grande medida, envolvia ampliar
recursos e o papel da MGA.
Luanda reconhece essas debilidades afirmando que sua “consciência marítima o
avançou nas mesmas proporções de suas necessidades” e que isso é resultado não
dos esforços impostos pelo conflito terrestres, mas também pelas “dificuldades
financeiras” restringindo a visão do Estado em relação ao mar e às políticas conjunturais,
permitindo a actuação descoordenada dos organismos que intervém no mesmo, com
iniciativas individuais.” (Apresentação da Delegação de Angola, 2008:32)
A condução da política externa e da política de defesa entre 2002 e 2017, assim, são
marcadas pela necessidade de estabilizar economicamente o país e reconstruir a sua
imagem no exterior. Lourenço sobe ao poder em um contexto diverso, com Angola
posicionada nos principais fóruns regionais e apto a implementar reformulações mais
significativas.
Grande parte das linhas gerais de política e das eventuais mudanças que Lourenço visa
conduzir foram contempladas na Estratégia de Longo Prazo lançada em 2023, conhecida
como Agenda Angola 2025. No documento, é possível vislumbrar as prioridades do
governo e suas principais diretrizes: 1) foco no desenvolvimento econômico como
prioridade das ações externas de Angola, com a menção, inclusive do desenvolvimento
socioeconômico sustentável como algo a ser garantido pela segurança nacional; 2)
preferência pelo multilateralismo, tanto nos aspectos políticos quanto econômicos, com
referência aos principais organismos africanos; 3) expressa vontade de ampliar o
protagonismo na África, especialmente através da participação ativa em arranjos
regionais, mencionando explicitamente o intuito de “continuar a liderar o processo de
manutenção da segurança e estabilidade política a vel regional (República de Angola,
2023:422)”; e 4) fortalecer a inserção internacional a partir do mar, reestruturando as
FAA, ampliando a MGA e construindo uma estratégia marítima alinhada com o Plano de
Ação da Estratégia Marítima Integrada da África 2050.
Equatorial, Gâmbia, Gabão, Gana, Guiné Conacri, Guiné Bissau, Libéria, Namíbia, Nigéria, São Tomé e Príncipe,
Senegal, Serra Leoa, África do Sul e Togo.
9
A CGG
9
foi criada em 2001 para funcionar como um âmbito de resolução de conflitos e harmonização da
exploração dos recursos naturais da região. São membros: Angola, Camarões, República Democrática do
Congo, Congo Brazzaville, Guiné Equatorial, Gabão, Nigéria e São Tomé e Príncipe.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
VOL. 16, Nº. 2
Novembro 2025-abril 2026, pp. 329-345
A Projeção Internacional de Angola: Condicionantes Internos da Política Externa
e da Política de Defesa
Nathaly Xavier Schutz
340
A política externa implementada por Lourenço, em nenhum momento, rompe com aquela
conduzida por Dos Santos, ao contrário disso, mantém suas linhas gerais e suas
principais relações estratégicas, como China e ssia. O que ocorre são ajustes de
condução mais sutis, notadamente a ampliação do multilateralismo, em contraste com a
preferência do governo anterior pelas tratativas bilaterais, em específico na economia, e
uma maior abertura para novos parceiros, em especial a Europa.
O que se percebe, assim, é que Lourenço, ao mesmo tempo em que não deseja
desagradar à elite do MPLA, busca construir uma inserção angolana mais concatenada
com os desafios atuais do país: desenvolvimento socio-econômico e projeção regional
mais qualificada. Aqui aparece, novamente, a ligação entre os aspectos domésticos, com
o governo tentando manter-se no poder, ao diminuir os descontentamentos da população
sem criar instabilidades excessivas dentro do Partido.
Assim como na política externa, Lourenço também vai imprimir na política de defesa um
novo tom. É marcante que, desde o início de seu governo, tem ocorrido uma redução
dos gastos em defesa como percentual do PIB. Além disso, um programa de
redimensionamento do Ministério da Defesa e profissionalização das tropas (Schutz,
2022).
Importante destacar que, em abril de 2018, são publicados o Conceito Estratégico de
Defesa Nacional, revogando o anterior, de 1993, e o Livro Branco de Defesa Nacional.
Apear da pacificação, em 2002, écom a saída de Dos Santos do poder que se tem a
reformulação do principal documento de defesa angolano. Destacam-se alguns aspectos,
como a manutenção da percepção de ameaça interna junto com a externa e a
identificação das novas ameaças de segurança cibercrime, terrorismo e mudanças
climáticas juntamente com os temas tradicionais corrida armamentista tradicional e
nuclear.
Além disso, os documentos também mencionam a necessidade de articular os objetivos
e as ações de política externa e política de defesa e a importância das Forças Armadas
como instrumento de expressão da política externa. Também afirma o desejo de
protagonismo africano, com o objetivo de “ser uma peça importante na liderança política
e econômica da África Central e Austral, na Conferência do Golfo da Guie manter uma
influência e responsabilidade na manutenção da paz e da estabilidade política e social
das sub-regiões em que se encontra inserida (República de Angola, 2018: 2316)”
Outro aspecto a ser considerado é o direcionamento para as atuações internacionais das
Forças Armadas. Dado o contexto doméstico pacífico e os objetivos de protagonismo
regional, Luanda começa a concentrar esforços nessa demonstração e projeção de poder
na África. No Livro Branco de Defesa Nacional, inclusive, afirma que “as novas dinâmicas
de ordem externa e interna determinam um novo modelo de inserção de Angola na arena
internacional e obrigam as Forças Armadas Angolanas a assumir novas
responsabilidades, compatíveis com o nível de ambição política do nosso país (Angola,
2018:2350)”.
No último discurso sobre o Estado da Nação, em outubro de 2024, Lourenço deu especial
ênfase à questão marítima, ressaltando a relevância de modernizar a MGA e ampliar os
investimentos nas infraestruturas. Avanços importantes haviam sido feitos, com
inauguração o Centro Nacional de Coordenação e Vigilância Marítima em janeiro de 2024,
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
VOL. 16, Nº. 2
Novembro 2025-abril 2026, pp. 329-345
A Projeção Internacional de Angola: Condicionantes Internos da Política Externa
e da Política de Defesa
Nathaly Xavier Schutz
341
ainda que com quatro anos de atraso, e a modernização da Base Naval de Luanda. A
política de defesa de Angola, desta forma, também traduz a necessidade do Estado de
articular as demandas domésticas com os objetivos internacionais. Para Plácido (2016),
fica evidente que a preocupação com a integridade territorial e a manutenção da
soberania caminha junto com o desejo de projeção regional e, também, as preocupações
com o desenvolvimento econômico.
Angola tem se posicionado, assim, como uma importante liderança africana. É importante
lembrar que, como foi mencionado, o país ocupa uma posição estratégica no
Continente, atuando como um vértice entre as regiões ocidental e central. A partir de
2025, Angola passou a ocupar a presidência da União Africana o que, para Lourenço,
representa uma oportunidade do país de implementar e influenciar as iniciativas na
promoção do desenvolvimento do Continente (CIPRA, 09/11/2024).
Em sua fala na Assembleia Geral da Nações Unidas, em setembro de 2024, Lourenço
destacou o empenho de Angola com a pacificação da África, invocando a sua experiência
na pacificação de seu conflito interno (CIPRA, 29/09/2024). O posicionamento de Angola
nos últimos anos tem refletido, desta forma, uma maior constância no objetivo de
consolidar-se como liderança regional. Tanto em declarações públicas, quanto em
documentos oficiais, essa menção é recorrente e, por certo, intencional.
A evolução da política externa e da política de defesa de Angola, ao longo das duas
últimas décadas, dessa forma, pode ser compreendida pelas necessidades internas, mas
também pelo “facto de Angola ser uma nação africana, com uma identidade histórica e
cultural partilhada com nações vizinhas, com uma condição geoestratégica particular
decorrente da sua maritimidade e da localização no cruzamento regional entre as regiões
central e austral do continente Africano, e como uma plataforma para a pacificação dos
conflitos a nível dos Estados africanos (Bembe, 2016, p. 27-28)”.
Considerações finais
Angola é um país complexo e com um histórico de violência em seu território que imprimi
marcas até os dias atuais. Ainda que tenha sofrido por mais de quatro décadas se
somadas a guerra de libertação e a posterior guerra civil com conflitos internos,
atualmente, Angola é identificada como uma liderança e uma força de estabilização da
região centro-austral africana.
Ao analisar a política externa e a política de defesa angolanas torna-se latente a
necessidade de compreender como essas mudanças domésticas impactaram na sua
inserção externa. Ainda que a atuação angolana no sistema internacional possa ser
compreendida a partir dos seus objetivos, existem condicionantes internos que não
podem ser ignorados.
Dentre esses fatores, o mais complexo e, muito provavelmente, aquele que tem mais
influência é o próprio MPLA. O MPLA, assim como vários outros casos africanos, é um
partido originado de um movimento de libertação que está no poder em Angola desde a
sua independência. Essa combinação, como foi visto ao longo do trabalho, imprimi
características muito particulares ao contexto interno angolano.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
VOL. 16, Nº. 2
Novembro 2025-abril 2026, pp. 329-345
A Projeção Internacional de Angola: Condicionantes Internos da Política Externa
e da Política de Defesa
Nathaly Xavier Schutz
342
A ampla participação dos militares em outras esferas políticas, a percepção de lealdade
das forças de segurança ao Partido e não ao Estado e a permanência de um mesmo
governante por quase 40 anos caracterizam uma Angola onde Partido, governo e Estado
se confundem. O interesse nacional acaba transformando-se no interesse do regime e a
definição da agenda estatal é pautada pelo desejo de permanecer no poder.
É esse contexto doméstico que influencia a formulação da política externa e de defesa
de Angola. E é por isso, também, que as mudanças políticas que acontecem dentro do
Estado tem um peso tão significativo na postura e papel que este tem nas relações
internacionais.
É possível, a partir dos dois grandes marcos recentes da história angolana a pacificação
em 2002 e a saída de Dos Santos do poder em 2017 identificar duas fases da inserção
do país no sistema internacional. Ainda que, tanto a política externa quanto a política
defesa, apresentem uma continuidade expressiva, fruto, em grande medida, da própria
manutenção do MPLA no poder, algumas mudanças importantes podem ser percebidas.
O período que abarca de 2002 a 2017 é marcado pela necessidade de normalização das
relações exteriores e reinserção de Angola, através da busca pela melhora da imagem
do país no exterior. É um período em que a diplomacia econômica ganha mais força e a
política de defesa ainda mantém traços do período do conflito, em certo descompasso
com a nova conjuntura. Por outro lado, amplia-se a cooperação multilateral na área da
defesa, especialmente com países do Sul global; em um contraste com a esfera
econômica, na qual a preferência segue sendo a bilateralidade.
Com a subida de Lourenço ao poder, o rearranjo e a modernização das Forças Armadas
Angolanas ganham maior força, assim como uma reorientação mais clara da política de
defesa que, agora, passa a ser voltada para o papel das FAA no exterior, entrelaçada na
própria política externa. Essa, por sua vez, amplia a atuação multilateral, fazendo dessa
uma das principais caraterísticas da inserção angolana e enxergando nas organizações e
fóruns internacionais uma plataforma para a projeção angolana na África e no mundo.
Angola segue enfrentando desafios importantes nessa inserção, notadamente sua
debilidade na estratégia marítima e as fragilidades econômicas derivadas de sua
economia baseada no petróleo. O governo de Lourenço, contudo, ao contrário de Dos
Santos, parece reconhecer mais claramente esses problemas e, talvez, possa enfrentá-
los com políticas mais adequadas. Isso, é claro, se isso não representar nenhuma ameaça
a sua manutenção no poder.
Referências
AEBY, Michael (2019). SADC The Southern Arrested Development Community. Policy
Dialogue Nº14, The Nordic Africa Institute, Uppsala.
ALMEIDA, Eugênio Costa; BERNARDINO, Luís Manuel Brás (2013). A Comissão Do Golfo
Da Guiné A Zona De Paz Cooperação Do Atlântico Sul. Organizações Interzonais Para A
Persecução Da Segurança Marítima Na Bacia Meridional Atlântica. Revista Militar, n.
2532.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
VOL. 16, Nº. 2
Novembro 2025-abril 2026, pp. 329-345
A Projeção Internacional de Angola: Condicionantes Internos da Política Externa
e da Política de Defesa
Nathaly Xavier Schutz
343
ALMEIDA, Cláudia (2019). Angola e os ventos de mudança e continuidade de João
Lourenço. Janus 2020/2021. Novembro de 2019.
ALMEIDA, Cláudia; SATULA, Benja (2018). Only one man for two Jobs: the leadership
transition in Angola. Presidential Power, 19/10/2018.
ALMEIDA, Eugênio Costa (2018). O papel de Angola como vértice do eixo centro-austral
de África: contributos para a segurança regional. CesContexto, nº20, Abril 2018.
Apresentação da Delegação de Angola. (2008) Angola no Contexto da Defesa e
Segurança Marítima do Golfo da Guiné. Simpósio das Marinhas de Língua Portuguesa.
Cadernos Navais.
AUGÈ, Benjamin (2019). Angola under João Lourenço: who are the new players of MPLA
State. Notes de l’IFRI, IFRI, December 2019.
ARON, Raymond (2002). Paz e Guerra entre as Nações. Brasília: Ed. UnB/IPRI.
AYOOB, Mohammed (2002). Inequality and theorizing in international relations: the case
of subaltern realism. International Studies Association.
BEMBE, Miguel Domingos (2016). A Política Externa Angolana: Doutrina e prática.
Mulemba: Revista Angolana de Ciências Sociais, v.6, n.11.
BERNARDINO, Manuel Brás (2013). A posição de Angola na arquitetura de paz e
segurança africana: análise da função estratégica das forças armadas angolanas.
Coimbra: Almedina.
BYE, Vegard; INGLES, Paulo; ORRE, Aslak (2021). Angola after Dos Santos: change and
continuity. CMI Working Paper, Number 8, November 2021.
CASTELLANO, Igor (2015). Política Externa Regional de Angola: mudanças frente à
ordem sistêmica (1975-2010). Austral: Revista Brasileira de Estratégia e Relações
Internacionais, v. 4, n. 7.
CENTRO DE IMPRENSA DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA DE ANGOLA (CIPRA)
(2024).Presidente declara empenho de Angola na busca de soluções para os conflitos em
África. 29 de setembro de 2024. Disponível em
https://cipra.gov.ao/noticias/1896/governo/na-assembleia-geral-da-onu/presidente-
da-republica-declara-empenho-de-angola-na-busca-de-solucoes-para-os-conflitos-em-
africa. Acessado em 10 de abril de 2025 .
CENTRO DE IMPRENSA DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA DE ANGOLA (CIPRA) (2024).
Grupo interministerial prepara presidência de Angola em 2025. Disponível em
https://cipra.gov.ao/noticias/2023/politica/uniao-africana/grupo-interministerial-
prepara-presidencia-de-angola-em-2025. Acessado em 17 de abril de 2025.
CLAPHAM, Cristopher (2012). From Liberation Movement to Government: Past Legacies
and The Challenge of Transition in Africa. Discussion Paper 8/2012 Johannesburg: The
Brenthurst Foundation.
CLARK, John F (2001). Realism, Neo-Realism and Africa's International Relations in the
Post-Cold War Era. In: DUNN,Kevin; SHAW, Timothy. (Ed). Africa’s Challenge to
International Relations Theory. New York: Palgrave.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
VOL. 16, Nº. 2
Novembro 2025-abril 2026, pp. 329-345
A Projeção Internacional de Angola: Condicionantes Internos da Política Externa
e da Política de Defesa
Nathaly Xavier Schutz
344
DUNN,Kevin (2001). MadLib #32: Th Blank African State: Rethinking the Sovereign State
in International Relations Theory In: DUNN,Kevin; SHAW, Timothy. (Ed). Africa’s
Challenge to International Relations Theory. New York: Palgrave.
GINGA, Damião Fernandes Capitão (2020). A Influência do Mar como Elemento da
Política Externa Angolana: Uma Diplomacia Naval Angolana. R. Esc. Guerra Nav., Rio de
Janeiro, v. 26, n. 2, p. 526-555.
HALLIDAY, Fred. (1999) Repensando as Relações Internacionais. Porto Alegre: Editora
da UFRGS.
HERBST, Jeffrey.; MILLS, Greg (2018). Can Ramaphosa, Lourenço and Mnangagwa
Change Africa’s Fortunes?. Disponível em:
www.thebrenthurstfoundation.org/article/can-ramaphosa-lourenco-and-mnangagwa-
change-africas-fortunes/ Acessado em 31 de março de 2020.
HILL, Christopher (2003). The Changing Politics of Foreign Policy. New York: Palgrave.
MALAQUIAS, Assis (2011). Angola’s Foreign Policy: Pragmatic Recalibrations. Occasional
Paper n. 84.
MATLOSA, Khabele (2010). The role of the Southern African Development Community in
mediating post-election conflicts: Case studies of Lesotho and Zimbabwe. In: MATLOSA,
Khabele; KHADIAGALA, Gilbert; SHALE, Victor. When elephants fight: preventing and
resolving election-related conflicts in Africa. Johannesburg: EISA.
MATSIMBE, Zefanias; DOMINGOS, Nelson (2018). Angola’s 2017 Elections and the Start
of a Pos-Dos Santos Era. Journal of African Elections, V.17, N.1.
MORRIS, Helen (2017). Angola september 2017 Update. ACLED, September 22, 2017.
Disponível https://acleddata.com/region/africa. Acessado em 26 de junho de 2019.
NGUBANE, S. (2004). Sources of Southern Africa Insecurity. In: SOLOMON, H. (Ed.).
Towards a Common Defence and Security Policy in the Southern African Development
Community. Pretoria: AISA.
PEGADO, Ainda (2014). Angola como potência regional emergente. Análise dos factores
estratégicos (2002-2012). Tese de Doutorado em Estudos Africanos Política e Relações
Internacionais, Instituto Universitário de Lisboa.
PLÁCIDO, Gustavo (2016). Angola no Golfo da Guiné e Atlântico Sul. Africa Defense and
Security.
RENO (2001). External Relations of Weak States and Stateless Regions. In: African
Foreign Policies: Power and Process. Edited by Gilbert M. Khadiagala and Terrence Lyons.
Boulder: Lynne Rienner.
REPÚBLICA DE ANGOLA (2018). Livro Branco de Defesa Nacional. Decreto Presidencial
nº108/18 de 25 de abril de 2018.
REPÚBLICA DE ANGOLA (2018). Conceito Estratégico de Defesa Nacional. Decreto
Presidencial nº107/18 de 23 de abril de 2018.
REPÚBLICA DE ANGOLA (2023). Visão Estratégica de Longo Prazo Angola 2050.
REPÚBLICA DE ANGOLA (2024). Mensagem sobre o Estado da Nação 2024.
JANUS.NET, e-journal of International Relations
e-ISSN: 1647-7251
VOL. 16, Nº. 2
Novembro 2025-abril 2026, pp. 329-345
A Projeção Internacional de Angola: Condicionantes Internos da Política Externa
e da Política de Defesa
Nathaly Xavier Schutz
345
ROQUE, Paula Cristina (2013). Angola’s crucial foreing policy drive. SWP Comments,
n.15, German Institute for International and Security Affairs, Berlin.
KHADIAGALA, Gilbert; LYONS, Terrence (2001). African Foreign Policies: Power and
Process. London: Rienner.
SCHUTZ, Nathaly Xavier (2022). Angola no Atlântico Sul. Conjuntura Austral. Revista do
Núcleo Brasileiro de Estratégia e Relações Internacionais da UFRGS. v.13.
SCHUTZ, Nathaly Xavier (2024). Angola no Caminho da Democracia: avanços e
retrocessos. Latitude, v.18, n.1.
SCHOLVIN, Soren (2017). South Africa and Secondary Powers: contestation in Sub-
Saharan Africa. South Africa Institute of International Affairs, Occasional Paper 270.
THOMSON, Alex (2010). An introduction to African Politics. 3ed. New York: Routledge.
VIDAL, Nuno Fragoso (2024). Angola State Security/Intelligence Service and their
support to the MPLA and presidential hegemony. Journal of Intelligence History, v.23,
n.2.
VINES, Alex (2021). Dos Santos to Lourenço: Angola’s transitional politics. The Africa
Governance Papers. Volume 1, Issue 1, November 2021.