Uma decorrente e derivada dos avanços biotecnológicos, deixaremos sem análise. A
segunda após a nascença, integrando componentes biónicos no próprio corpo, com vista,
não apenas ao acesso, mas a uma relação simbiótica entre ambos, que permitirá o auxílio
no raciocínio, na compreensão, no acesso a uma rede de mentes, transformando
radicalmente a capacidade do ser humano, que tornará os que o detêm em seres com
uma capacidade de conhecimento incomparavelmente superior aos demais, tornando
impossível o diálogo competente entre ambos. A terceira através do acesso, na decisão
e no conhecimento, dos sistemas de Inteligência Artificial, e dos seus outputs que
permitirão a tomada de decisão com base numa capacidade de análise mais complexa e
rápida o que aos que não a têm.
Pelo que, não sendo tal acesso universal, pese embora o benefício de tal desenvolvimento
possa a todos, em teoria abranger (cura cancro, longevidade, otimização de recursos)
nem todos estarão no mesmo nível comunicacional.
Eis chegados a Habermas
Chegamos então à questão que nos leva a considerar, por aqui, não excluindo outros que
foram levantados [Patrão Neves, 2020) em que as novas tecnologias, deixando de atuar
apenas no exterior do humano, poderão também ir abandonando a sua função
instrumental para conquistar outra, estruturante. No entanto, nessa situação, o ser
humano, em vez de se desenvolver endogenamente, intensificando a pessoa que é,
estaria a investir numa transformação exógena e artificial de si que, em vez de o fazer
ser mais o faria ser outro.
Esta questão central do artefacto enquanto agente que molda o próprio Homem,
encontramos igualmente em Heidegger (Heidegger, 2020) colocando a técnica como
realidade instrumental que serve os fins do Homem, mas também antropológica,
moldando-o.
A técnica, qualquer uma, é um meio e um fazer humano (Heidegger, 2020).
E de que forma tais considerandos afetam e colocam em perigo a Democracia? Partimos
da reflexão que nos traz Estanqueiro Rocha (Rocha, 2014):
Segundo Habermas, o consenso democrático, aquele que dá legitimidade às
instituições políticas, realiza-se no processo de comunicação e formação
coletiva da vontade, elaborados dentro de critérios normativos da razão
discursiva, isto é, onde existe ausência de coação e a participação de todos.
Ora como vimos, essa comunicação, mais do que uma alteração intrínseca do Homem,
numa evolução da AI, fica impossibilitada, pelo menos nos termos em que Habermas
(Habermas, 1999, p.71):
[Se] a linguagem natural é utilizada apenas como meio para a transmissão
de informações ou também como fonte da integração social. No primeiro caso
trata-se, no meu entender, de agir estratégico; no segundo, de agir
comunicativo. No segundo caso, a força consensual do entendimento
linguístico, (…) no primeiro caso o efeito de coordenação depende da
influência dos atores uns sobre os outros e sobre a situação da ação.