OBSERVARE
Universidade Autónoma de Lisboa
e-ISSN: 1647-7251
Vol. 15, N.º 2
Novembro 2024-Abril 2025
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O QUE PORTUGAL PRETENDE NO SAHEL: SEGURANÇA OU
NOTORIEDADE?
TIAGO BOTELHO DOS SANTOS
tdanielbs98@gmail.com
Investigador do CEI-ISCTE (Portugal) e Bolseiro de Investigação do CCCM. Atualmente
frequenta o Doutoramento em Estudos Internacionais no ISCTE-IUL e é Bolseiro de Investigação
pelo Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM), numa bolsa em conjunto com a FCT. É
licenciado em Estudos Asiáticos pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa desde 2020,
e mestre em Ciência Política e Relações Internacionais pela Faculdade de Ciências Sociais e
Humanas da Universidade Nova de Lisboa em 2022. A sua principal área de estudo são as
interações chinesas com a Ásia do Sul, com enfoque nas relações entre a China e o Paquistão
como base de suporte de expansão da BRI, e o estudo da China no contexto internacional.
Outras áreas de interesse envolvem o estudo de complexos securitários e relações de
interdependência securitária entre atores e agentes internacionais, tendo já desenvolvido obra no
assunto.
Resumo
O terrorismo transnacional no Sahel tem levado, desde 2012, a um aumento nas migrações
de refugiados para o Norte de África e Europa e com isto o perigo da radicalização dentro
destes dois espaços tem aumentado de forma acentuada. Para a UE, isto representa um
grande perigo à estabilidade regional que deve ser suprimido rapidamente e, para tal, a
comunidade europeia tem procurado intervir na região de modo a combater o extremismo e
a violência. Portugal, que não tem sido diretamente afetado por esta crise, tem sido
bastante participativo nas iniciativas regionais e procurado garantir junto da OTAN e da ONU,
a elaboração e manutenção de um plano de resolução do conflito no Sahel de forma a garantir
uma pacificação da região. Porém, sem um plano estratégico definido para a região e sem
qualquer consequência direta desta mesma instabilidade em território nacional, surge a
dúvida sobre quais as motivações portuguesas. Neste sentido, a presente investigação incide
sobre a análise das razões para a intervenção portuguesa no Sahel, procurando perceber as
preocupações de Portugal na região para a segurança nacional, regional e inter-regional, e
para o seu posicionamento internacional de forma a melhor percecionar as motivações por
detrás dos atos.
Palavras-chave
Sahel, Segurança, Notoriedade, Portugal, Relações África-UE.
Abstract
Since 2012, transnational terrorism in the Sahel has led to an increase in refugee migration
to North Africa and Europe, and the danger of radicalisation within these two areas has
increased sharply. For the EU, this represents a great danger to regional stability that must
be quickly suppressed, and, to this end, the European community has sought to intervene in
the region in order to combat extremism and violence. Portugal, which has not been directly
affected by this crisis, has been highly engaged in regional initiatives and has sought to ensure
that NATO and the UN develop and maintain a plan for resolving the conflict in the Sahel in
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O que Portugal pretende no Sahel: Segurança ou Notoriedade?
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order to ensure peace in the region. However, without a defined strategic plan for the region
and without any direct consequence of this same instability on national territory, the question
arises as to what the Portuguese motivations are. In this sense, this research focuses on
analysing the reasons for the Portuguese intervention in the Sahel, seeking to understand
Portugal's concerns in the region for national, regional, and interregional security, and for its
international positioning in order to better understand the motivations behind the acts.
Keywords
Sahel, Security, Notoriety, Portugal, Africa-EU relation.
Como citar este artigo
Santos, Tiago Botelho dos (2024). O que Portugal pretende no Sahel: Segurança ou Notoriedade?.
Janus.net, e-journal of international relations. VOL 15 N 2, Novembro 2024-Abril 2025, pp. 309-
330. https://doi.org/10.26619/1647-7251.15.2.14.
Artigo recebido em 3 de Dezembro de 2023 e aceite para publicação em 5 de Setembro
2024.
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O QUE PORTUGAL PRETENDE NO SAHEL: SEGURANÇA OU
NOTORIEDADE?
TIAGO BOTELHO DOS SANTOS
Introdução
Primeiramente, antes de iniciar a discussão sobre a temática proposta, vale aqui salientar
que o debate sobre a questão de Portugal no Sahel, na academia portuguesa e
internacional, é bastante reduzido e, deste modo, acaba por dificultar um maior debate
de ideias. Neste sentido, metodologicamente este artigo seguirá um raciocínio dedutivo,
baseado em informação maioritariamente qualitativa e principalmente adquirida nos
meios de comunicação tradicionais e em documentação primária proveniente dos órgãos
de governo portugueses, instituições internacionais e outras fontes de relevo, de forma
a contribuir para a discussão académica na questão da intervenção portuguesa no Sahel
e de que forma esta impacta a política externa portuguesa.
Em termos de estrutura, na introdução sedada uma pequena noção geral de conceitos
teóricos necessários à perceção do que significa a segurança e defesa num mundo
globalizado e ainda será apresentada a região do Sahel para um melhor entendimento
da base do problema, abrindo a discussão para o caso português. Na segunda parte serão
abordadas as bases da questão do Sahel e significância para a Europa, procurando
entender de que forma a região entra na estratégia de segurança europeia. Na terceira
parte, serão abordadas as linhas guia da estratégia portuguesa para o mundo de modo
a melhor percecionar a situação portuguesa, procurando perceber, à luz das iniciativas
em que se insere, qual o papel que Portugal desempenha enquanto estado-membro da
UE na região, quais os meios e por que formas Portugal procura a cooperação regional e
a pacificação do Sahel nas organizações em que se encontra extra-UE, e qual, ou quais,
os objetivos portugueses para o Sahel. Neste sentido, esta última parte tratará de
investigar de que formas a intervenção regional portuguesa permite o atingir dos grandes
objetivos da política externa portuguesa, na qual se insere a política de defesa nacional.
Por fim, será feita uma análise conclusiva de modo a melhor perceber de que formas esta
região acaba por estar presente na estratégia portuguesa para o mundo, procurando
delinear os argumentos de uma possível justificação para as ações portuguesas.
Num mundo globalizado, os conceitos de defesa e segurança estão inerentemente
conectados. As ameaças à integridade de um Estado podem provir de diversas esferas
que não a militar e, desta forma, os Estados procuram garantir a estabilidade e
segurança no seu espaço regional, através da cooperação regional e inter-regional com
outros Estados, como meio de garantir a segurança nacional (Ammerdown Group, 2016,
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p. 3; Paleri, 2008, pp. 5254). Buzan e Waever (2003, pp. 4050) permitem-nos
perceber de forma mais clara este internacionalizar da defesa através da Teoria dos
Complexos Securitários Regionais (TCSR), na qual argumentam que os Estados,
enquanto atores regionais, necessitam que exista estabilidade no complexo securitário
regional (CSR) em que se inserem, no caso português Europa e Norte de África, de forma
a garantirem a redução de perigos e ameaças à sua segurança nacional, o que pode ser
denominado por interdependência securitária. Para Labarre (2007, pp. 8687), esta
interdependência securitária é fomentada pela institucionalização do sistema
internacional e, neste sentido, o autor afirma que os Estados procurarão agir em torno
da cooperação regional sempre que possa ser catastrófico não o fazer. Esta primeira
parte de argumentação teórica prende-se com o foco securitário na ação dos Estados,
onde um Estado procurará agir de forma a evitar constrangimentos à segurança regional
de modo a garantir a segurança nacional. Por outro lado, Labarre (2007, p. 86) também
afirma que o contrário pode acontecer, ou seja, que os Estados acabam por procurar
perseguir os seus interesses no sistema internacional sempre que não seja catastrófico
fazê-lo. Esta última parte é aquilo que no presente ensaio se entende como a busca por
notoriedade e crescimento internacional nos diversos campos que acompanham a política
externa dos Estados, como a defesa, a segurança e a diplomacia.
Ademais, do ponto de vista analítico, estas ideias de segurança e notoriedade não são
mutuamente exclusivas. Um Estado pode ter numa região interesses securitários e ao
mesmo tempo procurar usufruir destes em busca de notoriedade no sistema
internacional. Porém, com esta tipologia de análise o que aqui se procura perceber é até
que ponto um objetivo se pode sobrepor ao outro, sobretudo porque notoriedade e
segurança não acontecem ao mesmo nível. O caso francês na região pode ser um modelo
plausível para esta situação, com os redobrados esforços na região a não se transmitirem
diretamente em notoriedade internacional devido, sobretudo, à falta de apoio regional
de alguns membros do G5 do Sahel, o que diminuiu a credibilidade francesa em questões
de segurança em África (Erforth & Tull, 2022; France 24 Staff, 2022). O caso português
também representa exatamente este dilema entre segurança e notoriedade, sendo isto
visível, por um lado, no facto de Portugal cooperar no âmbito da segurança europeia com
as iniciativas da UE e da ONU na região e, por outro lado, no facto de Portugal colocar
foco sobre o tema, na OTAN e na ONU, de modo a garantir uma posição mais proeminente
no sistema internacional ao mesmo tempo que procura uma maior notoriedade global
que se transmite na procura de um papel de coprodutor de segurança regional.
Ora tendo em conta o debatido, deve ser dada atenção ao facto da questão do Sahel ser
transnacional e afetar diretamente o espaço europeu, tendo-se tornado, por esta razão,
uma preocupação europeia e portuguesa na questão da segurança regional. Localizada
no sul do Saara enquanto zona limítrofe do Norte de África, esta região estende-se por
uma faixa terrestre horizontal entre o Mar Vermelho e o Atlântico com cerca de 5.400
quilómetros (Km) (Pires, 2022). O Sahel é composto por diferentes Estados (Fig.1),
nomeadamente a Burkina Faso, os Camarões, o Chade, a Eritreia, o Gâmbia, a Guiné, o
Máli, a Mauritânia, o ger, a Nigéria, o Senegal e o Sudão, e, especialmente na última
década, tem sido uma região onde imperam conflitos interétnicos e a propagação de
violência por grupos jihadistas.
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Esta propagação jihadista e conflitualidade interétnica tem preocupado a Europa nos anos
recentes, sobretudo devido ao aumento das migrações de refugiados e da propagação
de ideias extremistas para os Estados mediterrânicos do norte de África, criando
instabilidade no Mediterrâneo (Pye, 2021, pp. 1014). Em 2014, como forma de tentar
travar o fenómeno assistido, cinco Estados francófonos na região, os quais Burkina Faso,
Chade, Mali, Mauritânia e Níger, formaram o G5 do Sahel, uma organização que teve um
forte apoio europeu, sobretudo francês, e que pretendia ser o alicerce da cooperação
securitária regional, mas que demonstrou ao longo do tempo dificuldades em conseguir
lidar totalmente com a situação, muito devido ao facto de geograficamente ser uma
organização que corresponde à zona mais afetada por esta violência (Plank & Bergmann,
2021, pp. 383385). Na presente década, Portugal tem procurado começar a criar laços
fortes com este grupo, tendo inclusivamente participado, em 2021, no âmbito da
presidência portuguesa do Conselho UE, numa conferência entre estes Estados, e
procurado sublinhar junto da OTAN e dos seus parceiros europeus a importância da
estabilidade Africana para a Europa e a necessidade de garantir maior segurança no
flanco sul (Carreiras, 2023; RP - XXII Governo, 2021; RP - XXIII Governo, 2023).
Ademais, apesar dos problemas desta região afetarem diretamente o CSR português,
Portugal não é afetado diretamente por estas questões securitárias, visto a questão
saheliana não implicar nenhum efeito direto à segurança nacional portuguesa. Logo, é
possível colocar-se a hipótese sobre a intervenção portuguesa se encontrar ligada a uma
estratégia de crescimento internacional relacionada à cooperação regional em África e à
inserção na discussão securitária na ONU por pertença ao Conselho de Segurança. Outra
opção viável para a intervenção portuguesa pode prender-se com a diplomacia
económica e o crescimento português em África, sobretudo na expansão para mercados
fora dos tradicionais Magrebe e Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP).
Ambas as opções serão exploradas na terceira parte do presente ensaio.
Figura 1- Região do Sahel representada a amarelo
G5
Fonte: Público
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Tendo em conta o exposto, surge então a questão da necessidade de perceber qual será
o interesse português na região. Por conseguinte, o presente ensaio incide sobre a análise
das razões para a intervenção portuguesa no Sahel, procurando perceber as
preocupações e ações portuguesas na região para a segurança regional e inter-regional.
Vale ainda mencionar que a presente investigação procurará incidir, sobretudo, sobre as
relações com o G5 do Sahel de modo a melhor percecionar as motivações portuguesas
na e para a região.
2. O que tem o Sahel e o que significa para o espaço europeu?
A região do Sahel, na última década, tem assistido a um aumento progressivo do
terrorismo e violência que advém maioritariamente do aumento da instabilidade política,
das tensões regionais, da falha na aplicação de medidas de contraterrorismo eficazes e
da complexa realidade económica e social de pobreza na maioria da população, sobretudo
nos jovens («Global Terrorist Index - 2023», 2023, p. 60; Raleigh et al., 2021, pp. 123
126). De acordo com Green (2023), Pichon e Betant-Ramusen (2021, pp. 45), a última
razão mencionada pode ser explicada pela questão climática, principalmente pelas
mudanças extremas de temperatura que levam a ciclos de colheitas mais imprevisíveis,
à desertificação de certas áreas e à diminuição da terra arável, o que afeta diretamente
a economia dos Estados da região, que são maioritariamente Estados com agricultura de
subsistência, e, por conseguinte, gera um maior empobrecimento da população que é
muitas vezes aproveitado pela classe política destes Estados para ganho próprio, criando
maior desconfiança no sistema político.
Apesar do epicentro da instabilidade política da região, em grande parte pelos motivos
referidos, se ter dado no Mali, em 2012, através de uma rebelião provocada pelo
descontentamento dos Tuaregue, rapidamente o problema securitário se alastrou a
outras partes da região e, desde 2015, tem existido um aumento da violência, sobretudo
provocado pelo aproveitamento de grupos extremistas islâmicos da conflitualidade
interétnica regional, que tem levado a uma forte instabilidade política (Pichon & Betant-
Rasmussen, 2021, p. 2; Pye, 2021, p. 2). Além da instabilidade política e do
descontentamento dos jovens, estes grupos extremistas acabam também por beneficiar,
por um lado, da falha destes mesmos Estados em garantir medidas de contraterrorismo
viáveis, quer seja pela falta de funcionalidade, quer seja pela aplicação de estratégias
que violam muitas vezes a dignidade humana e os direitos humanos, e, por outro lado,
do empobrecimento da população, garantindo uma maior facilidade de recrutamento,
sobretudo entre os jovens, de novos membros para aumentar a rede de operações
(«Global Terrorist Index - 2023», 2023, p. 64; Green, 2023).
Ora, do ponto de vista da UE toda esta situação em conjunto com a intensificação da
violência no Sahel acaba por ser alarmante, algo visível na noção da Célula de
Aconselhamento e Coordenação Regional (CACR) da UE para o Sahel, fundada pela UE
em 2019 para apoiar a resolução da crise do Sahel, de que num mundo globalizado as
crises regionais no sul do Saara acabam por se tornar problemas securitários para a
Europa tornando-se, neste caso, a cooperação entre o G5 do Sahel e a UE essencial (CUE,
2019; EU RACC Sahel, 2022). Por conseguinte, é possível perceber que existe um nível
elevado de atividade europeia no sentido de estabilizar a região, sobretudo devido a
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quatro motivos que se prendem com a questão das migrações de refugiados, com a
propagação do terrorismo transnacional, com a garantia de continuidade de
desenvolvimento de projetos europeus regionais pré-conflito e com a comercialização de
recursos energéticos essenciais à produção e energia, como o Urânio, que são
abundantes em certos poderes regionais, como o Níger. Neste sentido, cabe agora
analisar brevemente cada motivo para melhor compreensão da significância da questão
do Sahel para o espaço europeu.
Primeiramente, na questão das migrações de refugiados, temos que o Sahel se localiza
diretamente abaixo de zonas sensíveis de migração de refugiados para o Mediterrâneo,
como a Argélia e a Líbia, países pertencentes ao Magrebe. Por norma, os dois Estados
anteriormente mencionados o aqueles onde existe um maior mero de migrantes
provenientes do Sahel, sobretudo devido à maior facilidade de passagem na fronteira
com o Mali e o Níger, os dois Estados mais afetados pela crise do Sahel, e à ação das
redes de tráfico no Mediterrâneo nas costas argelianas e libanesas (Bøås, 2021, pp. 55
57; Pye, 2021, p. 2). Aliás, mesmo apesar de, nos últimos três anos, a Argélia e a Líbia
terem fortalecido o controlo fronteiriço, este controlo não tem sido muito bem sucedido,
com milhares de migrantes a recorrerem a passaportes ilegais para conseguir contornar
a situação, mantendo o problema da crise de refugiados e continuando a gerar
preocupação no espaço europeu (AFP, 2023; Gasperini, 2023; NPR, 2022).
Segundamente, porque, como abordado, a disseminação de grupos jihadistas constitui
por si só um perigo à segurança e estabilidade europeias pela localização próxima desta
região com o Magrebe e o Mediterrâneo. Neste sentido, a junção desta disseminação
jihadista à propagação de ideias fundamentalistas islâmicas no Sahel, tem permitido uma
amplificação da violência regional, sobretudo pela expansão de grupos como a Al-Qaeda
e o Estado Islâmico (EI) que patrocinam agregados jihadistas locais, como por exemplo
o Jama'at Nasr al-Islam wal Muslimin (JNIM) e o Islamic State Sahel Province (IS Sahel)
(Lederer, 2023; Nsaibia, 2021; Pye, 2021, pp. 26; Raafat, 2021, pp. 68). Ademais,
em acrescento, estes grupos utilizam-se ainda da conflitualidade interétnica que define
a base da questão do Sahel para alastrarem as suas redes de operações às portas do
espaço europeu (Lederer, 2023; Nsaibia, 2021; Pye, 2021, pp. 26).
Terceiramente, porque, anteriormente a 2012, a UE era um dos grandes intervenientes
na região com projetos de desenvolvimento regional nas áreas do clima, segurança,
energia e comércio, sobretudo devido à estratégia de aproximação Europa-África entre a
UE e a União Africana (UA) (European Comission, 2010; Pye, 2021, pp. 23). Porém, a
conflitualidade no Sahel alterou a realidade até então vivida de cooperação e
desenvolvimento nas mais diversas áreas, obrigando ao redirecionar de fundos para a
resolução da instabilidade saheliana de modo a garantir, principalmente, que os projetos
desenvolvidos e em curso não seriam afetados. Isto foi visível quando, em 2012, a
questão da insurgência Tuaregue no Mali se começou a expandir para os países vizinhos
na região do Sahel, e a UE, de modo a proteger os seus interesses e a diminuir um foco
de violência às portas da europa, acabou por se tornar, quase que de forma inevitável,
o principal interveniente na mediação de conflitos a nível regional, criando e cooperando
em iniciativas que permitissem estabilizar a região e garantir a continuação da execução
dos projetos em curso e de novos projetos nas áreas estabelecidas de cooperação
(Pye, 2021, pp. 23; Venturi, 2017, pp. 612).
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Por fim, existe a questão energética que é de extrema importância para o espaço
europeu. A região do Sahel é uma das maiores reservas de urânio e gás natural no mundo
e, no contexto regional do G5 do Sahel, o Níger é um dos Estados mais importantes,
sendo o sétimo maior produtor de urânio no mundo (Arredondas, 2023). Aliás, para a
UE, o Níger é, a par do Cazaquistão, um dos dois maiores exportadores de urânio, sendo
responsável por cerca de 24% do urânio importado no espaço europeu, o que demonstra
o quão importante é esta região para a UE, sobretudo para os poderes nucleares como a
França, que, por si só, tem o Níger como segundo maior exportador logo atrás do
Cazaquistão (Arredondas, 2023; Maad, 2023; Melchior et al., 2022). Além do
mencionado, e tendo em conta que o conflito russo-ucraniano levou a que a UE
começasse a ponderar alterar mercados, um Sahel pacificado poderia significar uma fonte
mais segura, viável e barata, do que a custosa alternativa norte-americana do gás
liquefeito, que é muito mais custosa (Al Jazeera Staff, 2023; Reis, 2021, pp. 1415;
Schwikowski, 2022). Aliás, um Sahel pacificado também permitiria que alternativas
energéticas como o Trans-Sahara Gas Pipeline (TSGP), que tenham como objetivo
conectar as regiões do Sahel, Magrebe e Europa, pudessem voltar a ser debatidas no
âmbito da segurança energética, beneficiando assim as partes envolvidas e fortalecendo
os laços UE-UA (Al Jazeera Staff, 2023; Schwikowski, 2022).
Tendo em conta as quatro grandes áreas de significância do Sahel para a Europa, torna-
se óbvio o porquê desta região ser fulcral para o espaço europeu, quer na defesa da sua
fronteira sul, quer na proteção interna contra migrações em larga escala que permite a
penetração de grupos fundamentalistas islâmicos, quer na procura de alternativas de
mercado energético mais viáveis e menos custosas e morosas. Contudo, neste contexto,
nem todas as vertentes de preocupação europeia são do interesse nacional português,
algo que será abordado no capítulo que se segue, pelo que se torna fulcral perceber as
razões que levam Portugal a agir na região do Sahel, sobretudo naquela que é a sua ação
extra-UE.
3. Portugal no Sahel: Quais as motivações?
Enquanto estado-membro da UE, Portugal também age de acordo a resolver as questões
fulcrais anteriormente mencionadas, visto que, partindo do princípio europeu de
comunidade e cooperação, a segurança europeia em todas as áreas encontra-se
profundamente ligada à segurança nacional. Aliás, esta proximidade entre a segurança
europeia e a segurança nacional está patente tanto no Conceito Estratégico de Defesa
Nacional (CEDN), de 2013, como na proposta de revisão do CEDN (RCEDN), feita em
2023. Neste sentido, pode observar-se esta proximidade entre os conceitos europeu e
português de segurança e defesa quando -mos o CEDN, observando-se continuidade
no RCEDN, quer, por um lado, na menção da perceção do terrorismo e da criminalidade
transnacional organizada, onde se pode incluir o tráfico humano e de produtos ilícitos,
como ameaças à segurança nacional e europeia, quer, por outro lado, na noção de que
Portugal se encontra profundamente comprometido com a Política Comum de Segurança
e Defesa (PCSD) da UE (Conselho de Revisão do CEDN, 2023, pp. 79 e 11; Ministério
da Defesa, 2023b, p. 15 e 30).